Quem sou eu

Juiz de Direito desde 2007. Titular do Juizado Especial Cível de Lins(SP). Ex-Professor do Curso de Direito do Unisalesiano em Lins(SP). Ex-delegado de polícia. Motociclista, tatuado e corintiano do "bando de loucos".

22 de jan. de 2016

Resultado anunciado, via de regra, deve ser garantido pelo cirurgião plástico

Quando você contrata alguém, essa pessoa pode assumir uma “obrigação de meio” ou uma “obrigação de resultado”.
Classifica-se como “obrigação de meio” aquele compromisso que o contratado assume de empregar bons métodos para lhe atender, mas sem garantir, de forma absoluta, que o resultado será alcançado. Sílvio de Salvo Venosa (Direito Civil, vol. II, Ed. Atlas) bem exemplifica: “É o que sucede, por exemplo, com o advogado e o médico. Nem o advogado pode garantir o ganho de causa ao cliente, nem o médico pode assegurar a cura do paciente”. Tais profissionais devem se empenhar, mas o atingimento do resultado (ganho de causa ou cura) muitas vezes depende de fatores externos e nem sempre controláveis, ainda que haja utilização de melhor técnica. Em consequência, a obrigação somente será considerada descumprida e o profissional somente poderá ser responsabilizado se tiver agido de forma desidiosa, o que dependerá da análise das provas.
No caso da “obrigação de resultado”, o contratado necessariamente garante que ele seja atingido. Caso não tenha sido atingido, não será necessário avaliar culpa do profissional. No contrato de transporte, por exemplo, se a mercadoria não chegou ao destino, a consequência é o reconhecimento do descumprimento.
O Superior Tribunal de Justiça (STJ) tem reiteradamente decidido que o cirurgião plástico assume “obrigação de resultado”, ou seja, o compromisso de alcançar o resultado estético pretendido. Em suma: o que ele garantiu, deverá cumprir, pois do contrário poderá ser acionado a reparar eventuais danos morais e materiais. Os julgados têm ponderado que muitas vezes os cirurgiões projetam resultados no computador, o que cria não só a expectativa, mas a certeza de que serão atingidos. Tem sido decidido que cabe ao cirurgião demonstrar que o insucesso decorreu de fatores alheios à sua atuação, ou seja, o processo começa com a presunção de descumprimento contratual (presunção de culpa do médico) e o ônus da prova é do profissional. A responsabilidade, ressalte-se, não é objetiva (automática), pois o cirurgião pode conseguir demonstrar, por exemplo, que o paciente não cumpriu as orientações pós-operatórias etc. ou que houve caso fortuito (desdobramento imprevisível e inevitável). Confiram-se os Recursos Especiais 985.888 e 236.708.
O STJ já confirmou indenização por danos materiais e morais no caso de cirurgia de redução de mamas que deixou cicatrizes exageradas e visíveis diferenças de tamanho e contorno. Já refutou a culpa do médico por cicatrizes decorrentes das condições da pele e do tecido mamário.
Em cada caso, os detalhes farão a diferença. Normalmente será preciso submeter o reclamante ao exame pericial para que a insatisfação seja ou não confirmada e para que as causas (ou prováveis causas) sejam indicadas. Será importante analisar se o paciente obteve todas as informações sobre riscos, se o profissional estava habilitado e se as instalações e equipamentos eram adequados. A solução, na maioria das vezes, não é simples. Mas é importante difundir a informação.
Adriano Rodrigo Ponce de Oliveira
Juiz de Direito
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(publicado no Diário de Penápolis de 21/1/2016)



Manter casa de prostituição é crime

Decisão recente do Tribunal de Justiça sul-rio-grandense reverteu condenação imposta em primeira instância e reconheceu que não existe crime no ato de manter casa de prostituição.
A sentença reformada tinha deixado claro que eventual conivência social não tem o condão de tornar ineficazes os dispositivos penais que coíbem a manutenção de casa de prostituição, o rufianismo e outros delitos do gênero. A Câmara julgadora do TJRS, no entanto, por maioria, entendeu aplicável o princípio da adequação social, segundo o qual, mesmo que exista previsão legal (tipicidade formal), a conduta aceita pela sociedade não deve ser considerada criminosa (não tem tipicidade material).
Apesar de a conduta estar prevista no Código Penal, no entendimento dos desembargadores, como o Estado não combate a prostituição e como ela é tolerada também pela sociedade, não é razoável aceitar que seja reprimida penalmente.
O acórdão transcreveu precedentes no mesmo tribunal. O entendimento foi assim resumido: “A exploração de casa de prostituição, embora formalmente típica, é conduta amplamente tolerada pela sociedade, faz tempo, e muitas vezes pelo próprio Estado, que, através de sua administração, fecha olhos para o funcionamento escancarado de prostíbulos e de pontos de prostituição em plena via pública, além de ser estimulada e divulgada pela mídia. Então, não pode o próprio Estado, de um lado, coibir a prática através de sua função repressiva, e, de outro, pela via administrativa, permiti-la a olhos vistos” (Apelação Crime Nº 70.061.310.124, 6ª Câmara Criminal, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Bernadete Coutinho Friedrich, Julgado em 09/07/2015).
Todavia, a solução não está de acordo com o que tem decidido o egrégio Superior Tribunal de Justiça. Nos autos do Recurso Especial 1.508.423/MG julgado em setembro de 2015, por exemplo, ficou claro que o STJ não aplica o princípio da adequação social aos crimes de favorecimento da prostituição ou manutenção de casa de prostituição. Ao apreciar o “Habeas Corpus” 238.688/RJ, em agosto de 2015, o STJ salientou: “A jurisprudência desta Corte Superior orienta-se no sentido de que eventual tolerância de parte da sociedade e de algumas autoridades públicas não implica a atipicidade material da conduta de manter estabelecimento em que ocorra exploração sexual, delito tipificado no artigo 229 do Código Penal”.
O egrégio Supremo Tribunal Federal, em 2011, nos autos do “Habeas Corpus” 104.467, também se posicionou pela inaplicabilidade dos princípios da fragmentariedade e da adequação social: “Impossibilidade. Conduta típica. Constrangimento não configurado. 1. No crime de manter casa de prostituição, imputado aos Pacientes, os bens jurídicos protegidos são a moralidade sexual e os bons costumes, valores de elevada importância social a serem resguardados pelo Direito Penal, não havendo que se falar em aplicação do princípio da fragmentariedade. 2. Quanto à aplicação do princípio da adequação social, esse, por si só, não tem o condão de revogar tipos penais. Nos termos do art. 2º da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro (com alteração da Lei n. 12.376/2010), “não se destinando à vigência temporária, a lei terá vigor até que outra a modifique ou revogue”. 3. Mesmo que a conduta imputada aos Pacientes fizesse parte dos costumes ou fosse socialmente aceita, isso não seria suficiente para revogar a lei penal em vigor. 4. Habeas corpus denegado”.
Com a devida vênia de opiniões contrárias, concordo que a suposta tolerância em relação à existência de casas de prostituição não justifica, de forma alguma, que a lei penal possa deixar de ser aplicada. Caso contrário, outras práticas poderiam acabar sendo “descriminalizadas” com base no mesmo argumento, como por ex., o jogo do bicho. O principio da fragmentariedade diz que o Direito Penal deve se preocupar com os bens jurídicos mais importantes e que outras questões devem ser solucionadas por outros ramos do Direito. Em 2009 o Código Penal sofreu modificações (Lei 12.015) que somente reforçaram a intenção dos nossos legisladores não somente de manterem, mas de reforçarem a repressão penal de várias modalidades de exploração sexual: mediação para servir a lascívia de outrem (art. 227); favorecimento da prostituição ou outra forma de exploração sexual (art. 228); casa de prostituição (art. 229); rufianismo (art. 230); tráfico internacional de pessoa para fim de exploração sexual (art. 231); e tráfico interno de pessoa para fim de exploração sexual (art. 231-A).
Adriano Rodrigo Ponce de Oliveira
Juiz de Direito
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(publicado no Diário de Penápolis de 14/1/2016)

3 de jan. de 2016

Tipificação da corrupção no Código Penal

Tramita no Senado proposta para edição de um novo Código Penal (Projeto de Lei do Senado 236). Ao que consta, está na Comissão de Constituição e Justiça.
A tendência que o ato de exigir, solicitar, aceitar ou receber vantagem indevida, como representante de empresa ou instituição privada, para favorecer a si ou a terceiros, direta ou indiretamente, ou aceitar promessa de vantagem indevida para favorecer a si ou a terceiro, a fim de realizar ou omitir ato inerente a suas atribuições, passe a caracterizar infração penal.
Muito se fala da corrupção no setor público, mas ela está bastante presente nas empresas, especialmente nos setores que movimentam recursos (compras, financeiro). Penso que a criação desse tipo penal é mesmo necessária. Muitas vezes a vantagem exigida pelo comprador acaba sendo embutida no preço pelo fornecedor, o que repercute nas finanças da empresa e na economia como um todo. Devemos acompanhar atentamente a votação dessa proposta que tanto interessa à sociedade.
Enquanto isso, é bom lembrar o que o atual Código Penal (Decreto-Lei 2.848/1940) dispõe sobre a corrupção no título dos crimes contra a administração pública.
A corrupção passiva é a praticada pelo funcionário público e a corrupção ativa é a cometida por quem age como particular.
Normalmente todos os que concorrem para a mesma prática criminosa incidem no mesmo artigo de lei, mas o Código Penal decidiu tratar das condutas separadamente.
Eis a previsão sobre corrupção passiva:
Art. 317 - Solicitar ou receber, para si ou para outrem, direta ou indiretamente, ainda que fora da função ou antes de assumi-la, mas em razão dela, vantagem indevida, ou aceitar promessa de tal vantagem:
Pena – reclusão, de 2 (dois) a 12 (doze) anos, e multa.
§ 1º - A pena é aumentada de um terço, se, em conseqüência da vantagem ou promessa, o funcionário retarda ou deixa de praticar qualquer ato de ofício ou o pratica infringindo dever funcional.
§ 2º - Se o funcionário pratica, deixa de praticar ou retarda ato de ofício, com infração de dever funcional, cedendo a pedido ou influência de outrem:
Pena - detenção, de três meses a um ano, ou multa.
A solicitação da vantagem pode acontecer de forma explícita ou implícita (por gesto, insinuação, ironia etc.). Trata-se de crime formal que se configura com a mera solicitação ou recebimento da vantagem indevida; ou mesmo com a aceitação da promessa dela.
Ainda que o ato a ser praticado pelo funcionário seja legal, o crime se configurará. Já se entendeu que a vantagem revertida para a administração afasta o crime, mas é preciso analisar cada caso. Predomina o entendimento de que a vantagem não precisa ser patrimonial.
Tratemos da previsão dirigida ao particular:
Corrupção ativa
Art. 333 - Oferecer ou prometer vantagem indevida a funcionário público, para determiná-lo a praticar, omitir ou retardar ato de ofício:
Pena – reclusão, de 2 (dois) a 12 (doze) anos, e multa.
Parágrafo único - A pena é aumentada de um terço, se, em razão da vantagem ou promessa, o funcionário retarda ou omite ato de ofício, ou o pratica infringindo dever funcional.
O oferecimento, da mesma forma, pode ser feito por palavras, gestos e escritos. A postura de quem oferece deverá ser minuciosamente analisada para que a sua verdadeira intenção seja extraída. Pedir ao funcionário para “dar um jeitinho” geralmente não consuma a corrupção ativa por não envolver oferta de vantagem. Somente a oferta ou promessa idônea geram responsabilização penal.  O crime se consuma quando quem oferece a vantagem tem a intenção específica de fazer com que o funcionário pratique, retarde a prática ou omita “ato de ofício”, ou seja, algo que faça parte das atribuições dele. Basta que o funcionário tome conhecimento, não se exigindo que haja da maneira proposta e nem que se sinta ofendido. O particular que simplesmente atende à solicitação do funcionário corrupto, mantendo, portanto, postura passiva, não pratica o delito do art. 333. De qualquer forma, alimenta o esquema criminoso. A mera gratificação pelo bom atendimento que sucede o ato administrativo, desde que de pequeno valor, porque, em tese, não compromete o funcionamento do serviço público e não envolve má-fé, geralmente não configura o delito.
Adriano Rodrigo Ponce de Oliveira
Juiz de Direito / Professor no Unisalesiano
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(publicado no Diário de Penápolis de 17/12/2015)


Estágio profissional

Não há dúvida de que o estágio profissional, se bem aproveitado, pode significar importantíssima complementação à formação do estudante e diferenciá-lo dos concorrentes.
Ele oferece experiências diversas do estágio cumprido na faculdade. Ao atuar ao lado do profissional que está no mercado de trabalho, o estudante tem condições de conhecer problemas específicos. Na área jurídica, é possível desenvolver habilidades para administrar prazos; para lidar com a aflição e/ou a inconveniência do cliente ou do profissional que defende a outra parte; para se portar diante de propostas indecentes; para gerir o escritório; para manejar sistemas informatizados; para arquivar e encontrar informações necessárias ao desempenho da atividade etc. A depender do volume de serviço, o estagiário pode ter de encarar um dos maiores desafios: conciliar produtividade com qualidade.
O estudante deve ser criterioso para não cair numa cilada e acabar se tornando um mero expectador do profissional que não sabe delegar tarefas ou só delega as mais árduas e improdutivas para a formação; que não gosta de ensinar ou não tem tempo ou jeito para tanto. O estagiário de Direito, por exemplo, não pode se contentar em ficar levando papéis de lado para o outro ou servindo como mensageiro. Deve deixar claro que o seu interesse é conhecer a essência da atividade. Se a finalidade do estágio não estiver sendo atingida, deve ter a coragem de expor a sua insatisfação e, se o caso, procurar outra vaga. Faz parte da formação do estudante tomar esse tipo de decisão, bem como identificar a hora de se afastar do profissional que se revelar antiético, inescrupuloso, dissimulado, desleixado ou que não adotar postura condizente com a sua profissão na maneira de agir, pensar e falar.
O bom estagiário, qualquer que seja a área de atuação, tem de saber escrever. Alguns bons estágios exigem redação no processo seletivo. Para saber escrever, o candidato tem de gostar de ler. A boa redação só é adquirida com a prática. Portanto, o candidato deve treinar para conseguir se manifestar com objetividade e clareza. Deve saber se comunicar. Não basta o conhecimento teórico.
A discrição é fundamental. O estagiário de um estabelecimento de saúde, por exemplo, não pode comentar quem lá esteve e muito menos a finalidade da visita. Deve tomar cuidado ao se manifestar para não se exceder. Não pode confundir o bom tratamento que recebe da equipe com oportunidade para fazer comentários e brincadeiras impertinentes. Durante a convivência, acabará conhecendo rotinas e manias do profissional e de amigos dele, tomando ciência de situações particulares e presenciando momentos de descontração, mas deverá evitar comentar isso tudo mesmo com as pessoas que lhe são próximas. Não se recomenda acanhamento excessivo, mas o estagiário deve se lembrar de a intimidade é algo que se adquire gradativamente e desde que haja consentimento do outro.
Durante o estágio, o estudante, ainda que seja um aluno “nota 10”, não pode se esquecer da sua condição de aprendiz. Nem sempre é possível dar efetividade a tudo o que se aprende na teoria.
O estagiário estará sendo avaliado e deverá aguardar pacientemente o seu reconhecimento. Deverá aproveitar para demonstrar, além de conhecimento, cordialidade, lealdade e seriedade. O contato com o público poderá criar oportunidades. A pessoa que se sentir satisfeita com o atendimento poderá se tornar parceira na construção de uma promissora carreira. Vale a pena caprichar o tempo todo.
O estudante deve aproveitar o estágio para tirar dúvidas, mas deve escolher momentos oportunos para questionamentos e estudar antes de formulá-los, pois o profissional não terá condições de ficar explicando minuciosamente cada situação.
Nos dois últimos anos do curso de Direito, fiz acordo com a empregadora para que eu pudesse estagiar no Ministério Público, onde conheci profissionais que, anos depois, firmaram cartas de recomendação que encaminhei para bancas de concursos públicos, o que sem dúvida repercutiu positivamente para as minhas aprovações.
Sempre costumo dizer que a graduação é época de acumular conhecimento e não bens materiais. Muita gente precisa trabalhar para custear os estudos, mas aquele que tem condições de se dedicar a um bom estágio, ainda que sofra algumas privações (a compensação financeira nem sempre equivale àquela que poderia ter alcançada noutra atividade), deve optar por reforçar o conhecimento. Até mesmo o estágio sem remuneração deve ser cogitado se o estudante puder restringir despesas e contar com a ajuda financeira dos pais ou de terceiros. O candidato deve se conscientizar de que investirá tempo relativamente curto em algo que poderá render frutos pelo resto da vida. Deve ter paciência e consciência de que tudo tem o seu tempo; de que só quem planta pode colher.
Não seria o caso de eleger prioridades e planejar, imediatamente, uma reviravolta na busca por um bom futuro profissional?
Adriano Rodrigo Ponce de Oliveira
Juiz de Direito / Professor no Unisalesiano
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(publicado no Diário de Penápolis de 10/12/2015 e na edição de dezembro/2015 da Revista Comunica)



Sexo com menor de 14 anos, mesmo que consentido, é estupro


O Superior Tribunal de Justiça, ao analisar, em agosto de 2015, o Recurso Especial 1.480.881-PI, firmou posicionamento acerca de uma antiga discussão jurídica: sexo com menor de 14 anos, se consentido, deve mesmo caracterizar estupro ou é necessário avaliar cada caso? E se o agente está namorando a vítima há tempos? E se estão noivos? E se já convivem maritalmente? E se a família aceita a relação? E se a pessoa menor de 14 anos já tem experiência? E se naquela região a prática é aceita pela comunidade? Nesses casos deve mesmo incidir sanção penal que varia de 8 a 15 anos de reclusão?
A Terceira Seção do STJ enfrentou a discussão em regime de recursos repetitivos para uniformizar, no âmbito daquela Corte, a solução desse problema.
No entendimento dos Ministros, para a caracterização do crime de estupro de vulnerável previsto no art. 217-A, “caput”, do Código Penal, basta que o agente tenha conjunção carnal ou pratique qualquer ato libidinoso com pessoa menor de 14 anos. O consentimento da vítima, a sua experiência sexual anterior ou a existência de relacionamento amoroso entre o agente e a vítima não afastam a ocorrência do crime.
Suas Excelências levaram em consideração as alterações legislativas introduzidas no Código Penal pela Lei Federal 12.015/2009. Rechaçaram a tese de que a vulnerabilidade da vítima teria de ser aferida conforme as circunstâncias. Ficou decidido que a nova redação do artigo 217-A proibiu, de forma absoluta, conjunção carnal ou qualquer outro ato libidinoso com menor de 14 anos, sendo vedado ao aplicador da lei qualquer flexibilização da sua incidência para que não se esvazie a proteção constitucional destinada a tais pessoas. Nem mesmo a demonstração, por parte da defesa do réu, de que a pessoa ofendida tem conhecimento sexual ou é dada à prostituição, é capaz de favorecer o agente. Os julgadores consideraram que a evolução social não pode justificar a tolerância às práticas sexuais com menores de 14 anos, pois a legislação tem adotado caminho inverso, ou seja, tem enrijecido a proteção. Enfatizaram que não poderiam concordar que casos do gênero ficassem à mercê do subjetivismo do juiz, “sob pena de ocorrência de possíveis danos relevantes ao bem jurídico tutelado - o saudável crescimento físico, psíquico e emocional de crianças e adolescentes”. Arremataram que “praticamente todos os países do mundo repudiam o sexo entre um adulto e um adolescente - e, mais ainda, com uma criança - e tipificam como crime a conduta de praticar atos libidinosos com pessoa ainda incapaz de ter o seu consentimento reconhecido como válido”. Manifestaram repugnância à aceitação do “padrão de comportamento tipicamente patriarcal e sexista, amiúde observado em processos por crimes dessa natureza, nos quais o julgamento recai inicialmente sobre a vítima da ação delitiva, para, somente a partir daí, julgar-se o réu”.
Se na data do fato o agente ainda não tinha 18 anos, como sói acontecer, diante da inimputabilidade, responderá pelo ato infracional em conformidade com o disposto no Estatuto da Criança e do Adolescente.
O pronunciamento do STJ acabará influenciando das demais instâncias. As razões que o fundamentaram são consistentes. O Tribunal tem a incumbência de direcionar a interpretação das leis federais. A resposta penal para o estupro de vulnerável é grave. É preciso que todos estejam atentos aos riscos.
Adriano Rodrigo Ponce de Oliveira
Juiz de Direito / Professor no Unisalesiano
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(publicado no Diário de Penápolis de 5/11/2015 e no Correio de Lins de 7/11/2015)