Quem sou eu

Juiz de Direito desde 2007. Titular do Juizado Especial Cível de Lins(SP). Ex-Professor do Curso de Direito do Unisalesiano em Lins(SP). Ex-delegado de polícia. Motociclista, tatuado e corintiano do "bando de loucos".

8 de dez. de 2013

Um brinde aos farofeiros!



            Tempos atrás eu ouvi alguém reclamar do barulho que os farofeiros fazem quando chegam à praia e até do espaço [público] que ocupam! Muitos têm uma visão preconceituosa dessas pessoas que tanto podem nos ensinar.
        Segundo o Dicionário Aurélio, farofeiro é aquele que não reside no litoral, mas o frequenta, levando consigo aquilo que vai consumir.
            O que para uma parte das pessoas significa dificuldade, para o farofeiro é sinônimo de diversão. Ele se acomoda em qualquer lugar, pois procura ver o lado positivo do passeio. Tem entusiasmo e autoestima. Não fica lamuriando e nem se comparando ao outro. Não finge ser aquilo que não é. Não está preocupado em ostentar uma condição que não possui. Procura ser feliz com o que tem. É realista. É autêntico. Em vez de se preocupar com o congestionamento, diverte-se com aqueles com os quais se espreme num carro normalmente mais antigo e sem ar condicionado. Não se sujeita aos preços abusivos ao transportar o que vai consumir. Fica imune de riscos quando come só aquilo que ele mesmo preparou. Vive intensamente cada momento. Tem mais facilidade para se desligar dos compromissos e preocupações. Não se prende apenas ao trabalho. É criativo para contornar as dificuldades.Tem disposição de sobra para buscar a felicidade nas coisas simples da vida. É organizado e dedica parte do tempo para planejar os passeios futuros. Tem facilidade de conviver em grupo e, consequentemente, de aceitar as diferenças.Congrega crianças e idosos; reúne a família. Não tem vergonha do que é e não liga para “padrões fabricados”.E o que é mais importante: não fica preocupado com o que estão pensando dele e não se abate com a inveja e com as críticas de um ou outro que, mesmo mais abastado, não consegue se realizar na mesma medida e talvez por isso o critique.
          O farofeiro faz tudo isso, com raras exceções, sem prejudicar ninguém, muito embora a sua postura por vezes aborreça alguns. Aliás, não é tão difícil assim encontrar pessoas que se incomodam com a alegria de outras, o que é de se lamentar...
         Mas o que isso tem a ver com a nossa vida pessoal, familiar e profissional? É simples: temos de nos espelhar mais nos farofeiros.
            Não devemos nos frustrar porque não temos aquele bem de consumo que os meios de comunicação insistem que somos obrigados a possuir. Talvez ele não seja tão indispensável quanto pareça. Não precisamos protelar bons momentos da vida, pois sempre haverá alguma atividade física, profissional ou de lazer que será compatível com a nossa faixa etária, com a nossa condição física e socioeconômica e com a nossa disponibilidade de tempo. Precisamos ter em mente que até para se divertir a gente também cansa e tem de superar algumas dificuldades (juntar dinheiro; planejar; se deslocar; improvisar; aceitar o jeito do outro; reagir bem aos imprevistos; adaptar-se aos hábitos e horários das crianças etc.).
         O farofeiro às vezes faz barulho? Então façamos “barulho” também! Deixemos o marasmo de lado!
            Que tal tentar aceitar mais as diferenças, ampliar a tolerância, ter mais flexibilidade para trabalhar em grupo? Enxergar mais as oportunidades para ser feliz que estão ao seu alcance e ser grato a elas? Deixar as lamentações de lado e parar de achar que só você tem problemas ou que seus problemas são sempre maiores do que os dos outros? Sorrir mais? Dedicar mais tempo para você? Cuidar mais da sua saúde física e mental? Fazer mais do que tem feito no seu curso ou no seu trabalho? Oferecer mais ajuda e se interessarmais pelos outros? Parar de ficar pensando que determinada tarefa incumbe ao outro e não a você? Colocar em prática o que você mais discursa do que faz?
         Ter disposição para resolver as coisas da vida e conduzi-la da melhor forma é questão de treino da postura mental. Alguns têm tendência a desanimar e pode ser necessária ajuda profissional. Outros realmente enfrentam dificuldades que temporariamente abalam. Viver é realmente um desafio. Mas se não é possível que tudo dê certo o tempo todo, pelo menos que a gente tente enxergar o lado bom de cada situação e nos aprimorar com cada tropeço!
Adriano Rodrigo Ponce de Oliveira
Juiz de Direito / Professor no Unisalesiano
www.direitoilustrado.blogspot.com
(texto publicado na Revista Comunica – edição de novembro/2013)

Baba-ovo



         Costumo dizer que puxa-saco comigo não tem vez. Um elogio ao chefe vez ou outra é bem-vindo se sincero, despretensioso e comedido. Mas subordinado pegajoso...
         O puxa-saco está tão presente em todos os lugares que Brasil afora são os sinônimos previstos no Dicionário Aurélio, alguns bastante curiosos: “2. Aquele que bajula; adulador, adulão, aduloso, babão, baba-ovo, banhista, cafofa, chaleira, chaleirista, cheira-cheira, chupa-caldo, corta-jaca, engrossador, enxuga-gelo, escova-botas, incensador, lambedor, lambe-botas, lambe-cu, lambe-esporas, lambeta, lambeteiro, louvaminheiro, puxa-saco ou puxa-sacos, sabujo, xeleléu, xereta”.
         Pela minha maneira de interagir com subordinados e de tentar valorizá-los por meio de critérios outros, até hoje não tive tantas experiências desagradáveis com bajuladores, mas, com o propósito de induzir reflexão, resolvi citar uma em especial.
            Durante algum tempo Aparecida (nome fictício) atuou no meu setor. Tudo o que ela fazia, muito embora nada fora do rol de suas atribuições, precisava me mostrar que tinha feito. Depois de algum tempo foi ficando difícil conviver com ela. Aparecida sempre procurava deixar para fazer o seu trabalho quando eu estava presente, de modo que eu pudesse vê-la atuando. E enquanto cumpria seu papel, ficava me interrompendo e ressaltando os resultados. Às vezes eu estava em outro setor ou por alguma outra razão ausente da repartição e Aparecida, mesmo depois terminar seu trabalho, fazia questão de, com a minha chegada, retornar à minha sala e discorrer sobre as tarefas realizadas.
         Queria tanto agradar e se autopromover que se tornava enfadonha... Com a nítida intenção de tentar ser melhor do que outros (cujo desempenho,na prática,me agradava mais do que o dela), não me dava tempo suficiente para avaliar criteriosamente o seu trabalho e eventualmente elogiá-la. Mais do que isso, provocou o nosso distanciamento, pois passei a evitá-la.Já nem conseguia enxergar seus pontos positivos. Afinal, no ambiente de trabalho a gente quer pessoas prestativas, de bom trato, mas também discretas, humildes e com espírito de equipe.
            O subordinado precisa entender que o processo de reconhecimento profissional depende de vários fatores. Às vezes o superior hierárquico não tem tanta habilidade para fazer isso; outras vezes não se atenta suficientemente para o que acontece à sua volta, e noutros casos o reconhecimento esbarra nessas duas causas. Há maneiras sutis de solucionar essa dificuldade sem que a pessoa precise se tornar inoportuna, inconveniente, baba-ovo.
         O fato é que o superior, na maioria das vezes, sabe quem é quem no seu ambiente de trabalho. Repara na produtividade, na postura, no interesse e na competência. Ocorre que, infelizmente, nem sempre manifesta seu contentamento. É preciso que se expresse não só nos momentos de insatisfação, mas reconheça sempre o valor dos seus colaboradores. Isso pode ser treinado diariamente.
         Esse reconhecimento profissional, para o bem de todos, deve decorrer da fidelidade do subordinado, do seu comprometimento e da consideração de fatores como a ética e também a conduta pessoal. O verdadeiro parceiro é aquele que privilegia a cooperação em detrimento da competição.
         Na maciça maioria dos casos é a competência e a não a bajulação que determina promoções e outras oportunidades no ambiente de trabalho. O chefe que elege pela bajulação é injusto com os competentes e ilude o eleito. Perde a oportunidade de orientá-lo para que se aperfeiçoe. E pode estar colocando a empresa em risco.
          Aquele que se serve da bajulação para progredir pode estar maquiando deficiências profissionais e de personalidade. Os chefes devem estar atentos!
         Quando o bajulador consegue alguma coisa somente por conta do puxa-saquismo, isso fica muito nítido aos olhos de todos. Ele (e por vezes também o chefe) vira motivo de piadas. Os nomes estampados no dicionário deixam isso bem claro. E a conquistado bajulador costuma ser sempre provisória. Não raramente dura até que o chefe desavisado deixe seu posto e o sucessor monte outra equipe.
       Ao contrário, o colaborador eficiente pode até demorar um pouco mais para ser reconhecido, mas constrói a sua carreira sobre um rígido alicerce. Geralmente acaba se tornando quase queunanimidade no local de trabalho. É mantido quando a chefia se altera. Adquire cargo, salário, conforto, mas, sobretudo, respeito, consideração e liderança. Torna-se um exemplo de que vale a pena se esforçar e perseverar; conquistar pelo mérito. E se sente verdadeiramente realizado pelo reconhecimento profissional, além de seguro com a maior estabilidade.
       Sugiro, portanto, que você, que é bajulador, pense em investir o tempo na construção de uma carreira efetivamente sólida; e que você,que é chefe, destine a cada integrante da sua equipe o valor que ele realmente merece, depois de analisar quem realmente faz bem ao seu setor ou à sua empresa. Não é difícil o bajulador recorrer a outras artimanhas capazes de prejudicar o próximo para se sobressair... Essa sua postura não pode ser alimentada de forma alguma. É preciso mostrar a ele que não é e nem será a “última bolacha do pacote”.
      E quanto à Aparecida, desejo que ela seja muito feliz onde estiver atuando. Certamente o seu modo de agir agradará alguém, pois não faltarásuperior hierárquico que gostará de ter o ego massageado; portador de visão distorcida a respeito do tema que me propus a enfrentar.
Adriano Rodrigo Ponce de Oliveira
Juiz de Direito em Penápolis(SP)
Prof. no Unisalesiano
(redigido para a edição de dezembro/2013 da Revista Comunica)