Quem sou eu

Juiz de Direito desde 2007. Titular do Juizado Especial Cível de Lins(SP). Ex-Professor do Curso de Direito do Unisalesiano em Lins(SP). Ex-delegado de polícia. Motociclista, tatuado e corintiano do "bando de loucos".

8 de dez. de 2013

Baba-ovo



         Costumo dizer que puxa-saco comigo não tem vez. Um elogio ao chefe vez ou outra é bem-vindo se sincero, despretensioso e comedido. Mas subordinado pegajoso...
         O puxa-saco está tão presente em todos os lugares que Brasil afora são os sinônimos previstos no Dicionário Aurélio, alguns bastante curiosos: “2. Aquele que bajula; adulador, adulão, aduloso, babão, baba-ovo, banhista, cafofa, chaleira, chaleirista, cheira-cheira, chupa-caldo, corta-jaca, engrossador, enxuga-gelo, escova-botas, incensador, lambedor, lambe-botas, lambe-cu, lambe-esporas, lambeta, lambeteiro, louvaminheiro, puxa-saco ou puxa-sacos, sabujo, xeleléu, xereta”.
         Pela minha maneira de interagir com subordinados e de tentar valorizá-los por meio de critérios outros, até hoje não tive tantas experiências desagradáveis com bajuladores, mas, com o propósito de induzir reflexão, resolvi citar uma em especial.
            Durante algum tempo Aparecida (nome fictício) atuou no meu setor. Tudo o que ela fazia, muito embora nada fora do rol de suas atribuições, precisava me mostrar que tinha feito. Depois de algum tempo foi ficando difícil conviver com ela. Aparecida sempre procurava deixar para fazer o seu trabalho quando eu estava presente, de modo que eu pudesse vê-la atuando. E enquanto cumpria seu papel, ficava me interrompendo e ressaltando os resultados. Às vezes eu estava em outro setor ou por alguma outra razão ausente da repartição e Aparecida, mesmo depois terminar seu trabalho, fazia questão de, com a minha chegada, retornar à minha sala e discorrer sobre as tarefas realizadas.
         Queria tanto agradar e se autopromover que se tornava enfadonha... Com a nítida intenção de tentar ser melhor do que outros (cujo desempenho,na prática,me agradava mais do que o dela), não me dava tempo suficiente para avaliar criteriosamente o seu trabalho e eventualmente elogiá-la. Mais do que isso, provocou o nosso distanciamento, pois passei a evitá-la.Já nem conseguia enxergar seus pontos positivos. Afinal, no ambiente de trabalho a gente quer pessoas prestativas, de bom trato, mas também discretas, humildes e com espírito de equipe.
            O subordinado precisa entender que o processo de reconhecimento profissional depende de vários fatores. Às vezes o superior hierárquico não tem tanta habilidade para fazer isso; outras vezes não se atenta suficientemente para o que acontece à sua volta, e noutros casos o reconhecimento esbarra nessas duas causas. Há maneiras sutis de solucionar essa dificuldade sem que a pessoa precise se tornar inoportuna, inconveniente, baba-ovo.
         O fato é que o superior, na maioria das vezes, sabe quem é quem no seu ambiente de trabalho. Repara na produtividade, na postura, no interesse e na competência. Ocorre que, infelizmente, nem sempre manifesta seu contentamento. É preciso que se expresse não só nos momentos de insatisfação, mas reconheça sempre o valor dos seus colaboradores. Isso pode ser treinado diariamente.
         Esse reconhecimento profissional, para o bem de todos, deve decorrer da fidelidade do subordinado, do seu comprometimento e da consideração de fatores como a ética e também a conduta pessoal. O verdadeiro parceiro é aquele que privilegia a cooperação em detrimento da competição.
         Na maciça maioria dos casos é a competência e a não a bajulação que determina promoções e outras oportunidades no ambiente de trabalho. O chefe que elege pela bajulação é injusto com os competentes e ilude o eleito. Perde a oportunidade de orientá-lo para que se aperfeiçoe. E pode estar colocando a empresa em risco.
          Aquele que se serve da bajulação para progredir pode estar maquiando deficiências profissionais e de personalidade. Os chefes devem estar atentos!
         Quando o bajulador consegue alguma coisa somente por conta do puxa-saquismo, isso fica muito nítido aos olhos de todos. Ele (e por vezes também o chefe) vira motivo de piadas. Os nomes estampados no dicionário deixam isso bem claro. E a conquistado bajulador costuma ser sempre provisória. Não raramente dura até que o chefe desavisado deixe seu posto e o sucessor monte outra equipe.
       Ao contrário, o colaborador eficiente pode até demorar um pouco mais para ser reconhecido, mas constrói a sua carreira sobre um rígido alicerce. Geralmente acaba se tornando quase queunanimidade no local de trabalho. É mantido quando a chefia se altera. Adquire cargo, salário, conforto, mas, sobretudo, respeito, consideração e liderança. Torna-se um exemplo de que vale a pena se esforçar e perseverar; conquistar pelo mérito. E se sente verdadeiramente realizado pelo reconhecimento profissional, além de seguro com a maior estabilidade.
       Sugiro, portanto, que você, que é bajulador, pense em investir o tempo na construção de uma carreira efetivamente sólida; e que você,que é chefe, destine a cada integrante da sua equipe o valor que ele realmente merece, depois de analisar quem realmente faz bem ao seu setor ou à sua empresa. Não é difícil o bajulador recorrer a outras artimanhas capazes de prejudicar o próximo para se sobressair... Essa sua postura não pode ser alimentada de forma alguma. É preciso mostrar a ele que não é e nem será a “última bolacha do pacote”.
      E quanto à Aparecida, desejo que ela seja muito feliz onde estiver atuando. Certamente o seu modo de agir agradará alguém, pois não faltarásuperior hierárquico que gostará de ter o ego massageado; portador de visão distorcida a respeito do tema que me propus a enfrentar.
Adriano Rodrigo Ponce de Oliveira
Juiz de Direito em Penápolis(SP)
Prof. no Unisalesiano
(redigido para a edição de dezembro/2013 da Revista Comunica)