(reprodução do texto do Des. Xavier de Aquino publicado em http://blogs.estadao.com.br/fausto-macedo/juizes-enxugam-gelo-ao-soldo-meio-dia-diz-desembargador/, acessado em 27 jun. 2014)
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Augusto Cury é um dos psiquiatras e
escritores mais festejados nos dias de hoje, sendo certo que vendeu mais de 20
(vinte) milhões de livros no Brasil e publicou em mais de 60 (sessenta) países.
Ao tratar da ansiedade, sob o ponto de vista de como enfrentar este mal do
século, obtempera que a Síndrome do Pensamento Acelerado (SPA) é um dos
sintomas mais penetrantes no eu do ser humano na atualidade.
A certa altura do seu
escrito, o facultativo observa que “há muitas classes de profissionais voltados
para a sustentabilidade do funcionamento da sociedade que têm uma sobrecarga de
trabalho inumana. Entre elas, gostaria de ressaltar duas: a dos juízes
(magistrados) e a dos promotores de justiça. É surpreendente que os governos
federal e estaduais do país não atentem para a qualidade de vida desses diletos
profissionais.
Os juízes parecem
enxugar gelo sob o sol do meio-dia numa sociedade conflituosa, que, vitimada
pela SPA e pelas armadilhas da mente, tem pouca habilidade para proteger sua
emoção e resolver conflitos pacificamente, optando por instrumentos jurídicos
processuais. São mais de 100 milhões de processos no Brasil para um número
inexpressivo de menos de 20 mil juízes. Incontáveis magistrados, justamente por
serem altruístas, destroem sua saúde física e emocional trabalhando à noite,
sacrificando suas famílias, seus finais de semana e até os seus feriados.
Muitos deles, além
disso, sofrem com ameaças externas; mas o primeiro e o pior inimigo é mesmo o
que vem de dentro, decorrente do esmagamento da qualidade de vida pela
sobrecarga do trabalho intelectual exercido. A Síndrome do Pensamento Acelerado
os leva a ter fadiga ao acordar, cefaleia, dores musculares, ansiedade,
sofrimento por antecipação, transtorno do sono, déficit de memória. Como
teremos uma sociedade justa e fraterna se somos injustos exatamente com aqueles
que se encarregam de fazer justiça? É necessário dar atenção a todos os
profissionais do sistema judiciário” (in Ansiedade, como enfrentar o mal do século. Ed. Saraiva, São
Paulo. 4ª Tiragem. 2014. Págs. 143/144).
Com o tirocínio que só
o médico psiquiatra e terapeuta pode ter, Augusto Cury teve a sensibilidade de
abstrair a radiografia perfeita de um magistrado, tendo em vista, sem exceção,
que todo juiz ao abraçar a carreira, abre mão de seus sonhos, deixando de ter
qualidade de vida, alienando seus finais de semana, seu sono, descanso e, por
vezes, deixa de lado as pessoas que mais ama, esquecendo-se que ele também é um
simples mortal.
Tal procedimento lhe
acarreta os maus antefalados, daí porque durante toda a sua vida, diferente do
que ocorre com o cidadão comum, será obrigado a gerenciá-los, sob pena de assim
não o fazendo, criar uma dívida para com a sua saúde mental, o que amiúde
ocorre.
É bem de ver que, no
mais das vezes, o agente do Poder Judiciário inicia a carreira com pouca idade
e, de uma hora para a outra, assume significativas responsabilidades, isso
porque é inerente à função judicial dar a cada um o que é seu com igualdade e,
por via de consequência, o jovem magistrado, cônscio de suas responsabilidades,
paga a conta do noviciado, tendo de resolver os conflitos de interesse, não
raro, por si só, circunstância esta que inequivocamente cria situações estressantes.
Tal situação cria para
o juiz, no afã de exercer a arte de bem julgar, posicionamentos que o colocam
como carrasco de si mesmo, cujas consequências psicológicas serão constatadas
no futuro, de sorte a torná-lo uma pessoa só por excelência.
Não basta para ele os
conhecimentos adquiridos no curso de direito e tampouco nos exaustivos anos de
estudo para galgar o concurso público para exercer o mister judicial, posto que
a vida do magistrado é um constante estudar, produzindo-lhe, ad futurum,
significativo desgaste cerebral.
Indaga-se: com o
tratamento que recebe das autoridades constituídas e com as consequências
advindas das responsabilidades assumidas acima mencionadas, que boicotam a sua
qualidade de vida, tornando-o um moço velho, vale a pena ser juiz, tendo em
vista os vencimentos que lhes são atribuídos?!
José
Carlos G. Xavier de Aquino
é
desembargador do Tribunal de Justiça de São Paulo
Disponível em: http://blogs.estadao.com.br/fausto-macedo/juizes-enxugam-gelo-ao-soldo-meio-dia-diz-desembargador/
Acesso em: 27 jun. 2014