A
concessão da saída temporária aos presos é tão frequente quando a confusão que
decorre da sua diferenciação com o indulto.
Não
se pode conceber que grandes jornais e emissoras de televisão, responsáveis
pela disseminação da informação equivocada que hoje está “na boca do povo”, não
se preocupem com a revisão jurídica de seus textos.
É
bem verdade que a diferença é técnica, mas tem sido decepcionante ver até servidores
públicos da área se equivocarem com constância, mesmo os bacharéis em Direito.
Indulto
e saída temporária são institutos diversos...
Quando
alguém pratica uma infração penal, surge para o Estado o direito de punir. O
indulto é uma espécie de perdão, de clemência. Por meio do tal incidente de
execução o Estado renuncia àquele direito, abre mão de punir ou de continuar
punindo o infrator, ou permite a comutação da pena originalmente imposta pelo
Poder Judiciário. A competência é afeta ao Presidente da República, que
discricionariamente, por decreto, decide pela concessão. Tem caráter coletivo
(a modalidade individual recebe o nome de “graça”) e é concedido
espontaneamente. Não atinge os efeitos secundários penais e extrapenais da
condenação (persiste o dever de reparar civilmente o dano). Por meio do indulto
o Presidente pode, como dito, extinguir, diminuir ou comutar a pena. A
concessão pode ser condicionada a circunstâncias atuais ou futuras. É possível,
por exemplo, que se exija primariedade, idade máxima do sentenciado,
cumprimento de certa fração da pena ou específico regime prisional. Há,
portanto, motivação política no ato do Presidente (já se fez uso dele
unicamente para o esvaziamento de presídios), que, uma vez editado, será
cumprido pelas Varas de Execuções, incumbindo aos respectivos Juízes a análise
do preenchimento de requisitos e a efetiva extensão do favor a cada condenado.
A
saída temporária tem contornos bem diferenciados. É ato do Juiz da execução (e
não do Presidente da República). Como o próprio nome indica, a liberdade é
efêmera, excepcional, e não definitiva como aquela que pode decorrer do
indulto. A Lei de Execuções Penais somente autoriza a concessão àquele que
estiver cumprindo pena em regime semiaberto (o indulto pode abarcar qualquer
regime). Três intenções justificam a saída temporária: visita à família; frequência
a curso supletivo profissionalizante, ou mesmo de ensino médio ou superior; ou
participação em atividades que contribuam para a ressocialização. O Juiz deve
considerar o mérito do condenado e a compatibilidade da saída com a finalidade
da pena. As saídas estão limitadas ao prazo máximo de 7 dias e podem ser
concedidas até cinco vezes por ano (salvo se concedidas para a frequência a
cursos, quando terão a mesma duração deles). Na prática costumam ser
autorizadas no Carnaval, na Páscoa, no Dia das Mães, no Dia dos Pais, no
feriado de Finados, no Natal e na virada do ano, mas a lei não estabelece datas.
A prática de fato definido como crime doloso dá causa ao cancelamento imediato
do benefício. O preso precisa ter cumprido 1/6 do total da pena (ou 1/4 ser for
reincidente). A Lei 12.258/2010 passou a permitir ao juiz que determine o uso
de equipamento de monitoração eletrônica pelo condenado, mas, é claro, é
preciso que o aparelho esteja disponível em número suficiente. A norma inda
impôs as seguintes condições mínimas: (I) fornecimento do endereço onde reside
a família a ser visitada ou onde poderá ser encontrado durante o gozo do
benefício; (II) recolhimento à residência visitada, no período noturno; (III)
proibição de frequentar bares, casas noturnas e estabelecimentos congêneres.
Previu intervalos mínimos de 45 dias entre as saídas, a não ser nos casos de
frequência a curso profissionalizante, de instrução de ensino médio ou
superior.
Quando
eu era Delegado de Polícia, não havia sintonia entre as Secretarias da
Administração Penitenciária e de Segurança Pública. Nem sempre a primeira
oferecia e nem sempre a segunda solicitava ou aproveitava as informações
referentes às identidades e endereços declarados pelos beneficiados. Antes de
cada concessão os policiais começavam a tentar adivinhar se determinado preso
seria beneficiado e se desdobravam para tentar confirmar tal suspeita a fim de
acompanhar os seus passos.
O
indulto normalmente é concedido no período natalino. As saídas temporárias
costumam ser deferidas tanto para as festas de final de ano quanto para outras
datas festivas, como já ressaltado. A coincidência de concessões no Natal pode
ser uma das causas da referência aos institutos como se fossem sinônimos.
Infelizmente
a finalidade de propiciar ao condenado alguns dias de convívio familiar nem
sempre é alcançada, seja porque muitas vezes ele sequer possui família nas
proximidades ou não será recebido por ela; seja porque ainda não há suficiente
fiscalização sobre a sua conduta (muito embora as polícias estejam fazendo
visitas surpresas aos endereços); seja porque muitas vezes o beneficiado se
serve da liberdade para o cometimento de crimes, o que tem feito a sociedade
questionar cada vez mais o benefício...
Adriano
Rodrigo Ponce de Oliveira
Juiz
de Direito / Professor no Unisalesiano
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