Quem sou eu

Juiz de Direito desde 2007. Titular do Juizado Especial Cível de Lins(SP). Ex-Professor do Curso de Direito do Unisalesiano em Lins(SP). Ex-delegado de polícia. Motociclista, tatuado e corintiano do "bando de loucos".

11 de mai. de 2015

Saída temporária "versus" indulto (versão 2015)


            A concessão da saída temporária aos presos é tão frequente quando a confusão que decorre da sua diferenciação com o indulto.
            Não se pode conceber que grandes jornais e emissoras de televisão, responsáveis pela disseminação da informação equivocada que hoje está “na boca do povo”, não se preocupem com a revisão jurídica de seus textos.
            É bem verdade que a diferença é técnica, mas tem sido decepcionante ver até servidores públicos da área se equivocarem com constância, mesmo os bacharéis em Direito.
            Indulto e saída temporária são institutos diversos...
            Quando alguém pratica uma infração penal, surge para o Estado o direito de punir. O indulto é uma espécie de perdão, de clemência. Por meio do tal incidente de execução o Estado renuncia àquele direito, abre mão de punir ou de continuar punindo o infrator, ou permite a comutação da pena originalmente imposta pelo Poder Judiciário. A competência é afeta ao Presidente da República, que discricionariamente, por decreto, decide pela concessão. Tem caráter coletivo (a modalidade individual recebe o nome de “graça”) e é concedido espontaneamente. Não atinge os efeitos secundários penais e extrapenais da condenação (persiste o dever de reparar civilmente o dano). Por meio do indulto o Presidente pode, como dito, extinguir, diminuir ou comutar a pena. A concessão pode ser condicionada a circunstâncias atuais ou futuras. É possível, por exemplo, que se exija primariedade, idade máxima do sentenciado, cumprimento de certa fração da pena ou específico regime prisional. Há, portanto, motivação política no ato do Presidente (já se fez uso dele unicamente para o esvaziamento de presídios), que, uma vez editado, será cumprido pelas Varas de Execuções, incumbindo aos respectivos Juízes a análise do preenchimento de requisitos e a efetiva extensão do favor a cada condenado.
            A saída temporária tem contornos bem diferenciados. É ato do Juiz da execução (e não do Presidente da República). Como o próprio nome indica, a liberdade é efêmera, excepcional, e não definitiva como aquela que pode decorrer do indulto. A Lei de Execuções Penais somente autoriza a concessão àquele que estiver cumprindo pena em regime semiaberto (o indulto pode abarcar qualquer regime). Três intenções justificam a saída temporária: visita à família; frequência a curso supletivo profissionalizante, ou mesmo de ensino médio ou superior; ou participação em atividades que contribuam para a ressocialização. O Juiz deve considerar o mérito do condenado e a compatibilidade da saída com a finalidade da pena. As saídas estão limitadas ao prazo máximo de 7 dias e podem ser concedidas até cinco vezes por ano (salvo se concedidas para a frequência a cursos, quando terão a mesma duração deles). Na prática costumam ser autorizadas no Carnaval, na Páscoa, no Dia das Mães, no Dia dos Pais, no feriado de Finados, no Natal e na virada do ano, mas a lei não estabelece datas. A prática de fato definido como crime doloso dá causa ao cancelamento imediato do benefício. O preso precisa ter cumprido 1/6 do total da pena (ou 1/4 ser for reincidente). A Lei 12.258/2010 passou a permitir ao juiz que determine o uso de equipamento de monitoração eletrônica pelo condenado, mas, é claro, é preciso que o aparelho esteja disponível em número suficiente. A norma inda impôs as seguintes condições mínimas: (I) fornecimento do endereço onde reside a família a ser visitada ou onde poderá ser encontrado durante o gozo do benefício; (II) recolhimento à residência visitada, no período noturno; (III) proibição de frequentar bares, casas noturnas e estabelecimentos congêneres. Previu intervalos mínimos de 45 dias entre as saídas, a não ser nos casos de frequência a curso profissionalizante, de instrução de ensino médio ou superior.
            Quando eu era Delegado de Polícia, não havia sintonia entre as Secretarias da Administração Penitenciária e de Segurança Pública. Nem sempre a primeira oferecia e nem sempre a segunda solicitava ou aproveitava as informações referentes às identidades e endereços declarados pelos beneficiados. Antes de cada concessão os policiais começavam a tentar adivinhar se determinado preso seria beneficiado e se desdobravam para tentar confirmar tal suspeita a fim de acompanhar os seus passos.
            O indulto normalmente é concedido no período natalino. As saídas temporárias costumam ser deferidas tanto para as festas de final de ano quanto para outras datas festivas, como já ressaltado. A coincidência de concessões no Natal pode ser uma das causas da referência aos institutos como se fossem sinônimos.
            Infelizmente a finalidade de propiciar ao condenado alguns dias de convívio familiar nem sempre é alcançada, seja porque muitas vezes ele sequer possui família nas proximidades ou não será recebido por ela; seja porque ainda não há suficiente fiscalização sobre a sua conduta (muito embora as polícias estejam fazendo visitas surpresas aos endereços); seja porque muitas vezes o beneficiado se serve da liberdade para o cometimento de crimes, o que tem feito a sociedade questionar cada vez mais o benefício...
Adriano Rodrigo Ponce de Oliveira
Juiz de Direito / Professor no Unisalesiano
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