A
fraude contra credores está prevista
nos artigos 158 e seguintes do Código Civil. Pratica fraude aquele que deve,
não tem recursos para pagar e mesmo assim transmite bens, gratuita ou
onerosamente, ou perdoa dívidas, inviabilizando o recebimento por parte dos
seus credores.
Segundo
ao artigo 159, serão “anuláveis os contratos onerosos do
devedor insolvente, quando a insolvência for notória, ou houver motivo para ser
conhecida do outro contratante”. No caso de transmissão gratuita (como a
doação), esse conhecimento por parte do destinatário do bem nem é exigido, ou
seja, ele pode até estar de boa-fé.
A
chamada ação paulina ou revocatória poderá ser intentada contra o devedor
insolvente, a pessoa que com ele celebrou a estipulação considerada
fraudulenta, ou terceiros adquirentes que hajam procedido de má-fé.
Presumem-se,
porém, de boa-fé e valem os negócios ordinários indispensáveis à manutenção de
estabelecimento mercantil, rural, ou industrial, ou à subsistência do devedor e
de sua família. Ou seja, nem todo negócio poderá ser desfeito.
O
negócio que o devedor firma antes mesmo da cobrança judicial, como se vê, pode
ser atingido se vier a ser considerado fraudulento.
O
Superior Tribunal de Justiça já decidiu, inclusive, que é possível reconhecer
fraude contra credores mesmo que o débito do vendedor do bem ainda não esteja
definitivamente constituído. Em suma: se o vendedor está com dívida para vencer
e ardilosamente começa a se desfazer do patrimônio, os negócios poderão ser
desfeitos pelo Judiciário e as pessoas que com ele negociaram eventualmente
poderão ser atingidas se tiverem aderido ao intento ilícito (Recurso Especial
1.324.308/PR, Rel. Ministro João Otávio de Noronha, julgado em 26/08/2014).
A
fraude à execução foi objeto dos
artigos 593 e seguintes do Código de Processo Civil: “Art. 593. Considera-se em
fraude de execução a alienação ou oneração de bens: I - quando sobre eles
pender ação fundada em direito real; II - quando, ao tempo da alienação ou oneração,
corria contra o devedor demanda capaz de reduzi-lo à insolvência; III - nos
demais casos expressos em lei”.
A
fraude à execução também foi prevista como crime no art. 179 do Código Penal:
“Fraudar execução, alienando, desviando, destruindo ou danificando bens, ou
simulando dívidas: Pena - detenção, de seis meses a dois anos, ou multa.
Parágrafo único - Somente se procede mediante queixa”.
Normalmente
quando alguém adquire um carro usado, promove pesquisa junto ao Detran para
saber se existe restrição (bloqueio). Essa cautela realmente deve ser sempre
adotada. Se o negócio foi firmado e já existia bloqueio, dificilmente o
comprador não será atingido pelo reconhecimento judicial da fraude. Isso porque
com o lançamento da restrição se presume que todos dela passam a ter
conhecimento.
Acontece que
pode existir execução em trâmite e a justiça ainda não ter deliberado pelo
bloqueio ou mesmo a determinação ainda não ter sido recebida na repartição de
trânsito ou ainda não ter sido lançada. Qualquer que seja o contexto, a
inexistência de bloqueio formal nem sempre significará paz para o comprador.
Isso porque o terceiro interessado poderá ajuizar pedido tendente à comprovação
de que o comprador estava mancomunado com o vendedor do automóvel, ou seja, de
que ambos ajustaram negócio justamente para frustrar os credores deste último.
A avaliação da existência ou não de boa-fé do comprador dependerá da análise de
detalhes de cada caso.
Via de regra,
a existência de má-fé por parte de quem compra será, como dito, analisada.
Todavia, se o vendedor do veículo for devedor do fisco (tributos), ou seja, se
contra ele já tiver sido expedida certidão de dívida ativa, existindo ou não
ação de execução fiscal, a negociação do bem será fatalmente afetada,
independentemente de nada constar no cadastro do Detran. Isso porque o artigo
185 do Código Tributário, alterado pela Lei Complementar 118/2005, determina:
“Presume-se fraudulenta a alienação ou oneração de bens ou rendas, ou seu
começo, por sujeito passivo em débito para com a Fazenda Pública, por crédito
tributário regularmente inscrito como dívida ativa”, a não ser que tenham sido
reservados, pelo devedor, bens ou rendas suficientes ao total pagamento.
Conforme já decidiu, “a diferença de tratamento entre a fraude civil e a fraude
fiscal justifica-se pelo fato de que, na primeira hipótese, afronta-se
interesse privado, ao passo que, na segunda, interesse público, porquanto o
recolhimento dos tributos serve à satisfação das necessidades coletivas” (STJ,
Recurso Especial 1.141.990/PR, Rel. Min. Luiz Fux, julgado aos 10/11/2010). O
ideal, portanto, é pesquisar se o vendedor deve tributos e recorrer não só aos
cadastros do Judiciário, mas também das repartições públicas...
Portanto,
esteja sempre muito atento e escolha muito bem com quem vai negociar! Às vezes
o que parece barato se torna muito caro!
Adriano Rodrigo Ponce de Oliveira
Juiz de Direito / Professor no Unisalesiano
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