Quem sou eu

Juiz de Direito desde 2007. Titular do Juizado Especial Cível de Lins(SP). Ex-Professor do Curso de Direito do Unisalesiano em Lins(SP). Ex-delegado de polícia. Motociclista, tatuado e corintiano do "bando de loucos".

1 de mai. de 2015

Fraude contra credores e fraude à execução


A fraude contra credores está prevista nos artigos 158 e seguintes do Código Civil. Pratica fraude aquele que deve, não tem recursos para pagar e mesmo assim transmite bens, gratuita ou onerosamente, ou perdoa dívidas, inviabilizando o recebimento por parte dos seus credores.

Segundo ao artigo 159, serão “anuláveis os contratos onerosos do devedor insolvente, quando a insolvência for notória, ou houver motivo para ser conhecida do outro contratante”. No caso de transmissão gratuita (como a doação), esse conhecimento por parte do destinatário do bem nem é exigido, ou seja, ele pode até estar de boa-fé.

A chamada ação paulina ou revocatória poderá ser intentada contra o devedor insolvente, a pessoa que com ele celebrou a estipulação considerada fraudulenta, ou terceiros adquirentes que hajam procedido de má-fé.

Presumem-se, porém, de boa-fé e valem os negócios ordinários indispensáveis à manutenção de estabelecimento mercantil, rural, ou industrial, ou à subsistência do devedor e de sua família. Ou seja, nem todo negócio poderá ser desfeito.

O negócio que o devedor firma antes mesmo da cobrança judicial, como se vê, pode ser atingido se vier a ser considerado fraudulento.

O Superior Tribunal de Justiça já decidiu, inclusive, que é possível reconhecer fraude contra credores mesmo que o débito do vendedor do bem ainda não esteja definitivamente constituído. Em suma: se o vendedor está com dívida para vencer e ardilosamente começa a se desfazer do patrimônio, os negócios poderão ser desfeitos pelo Judiciário e as pessoas que com ele negociaram eventualmente poderão ser atingidas se tiverem aderido ao intento ilícito (Recurso Especial 1.324.308/PR, Rel. Ministro João Otávio de Noronha, julgado em 26/08/2014).

A fraude à execução foi objeto dos artigos 593 e seguintes do Código de Processo Civil: “Art. 593. Considera-se em fraude de execução a alienação ou oneração de bens: I - quando sobre eles pender ação fundada em direito real; II - quando, ao tempo da alienação ou oneração, corria contra o devedor demanda capaz de reduzi-lo à insolvência; III - nos demais casos expressos em lei”.

A fraude à execução também foi prevista como crime no art. 179 do Código Penal: “Fraudar execução, alienando, desviando, destruindo ou danificando bens, ou simulando dívidas: Pena - detenção, de seis meses a dois anos, ou multa. Parágrafo único - Somente se procede mediante queixa”.

Normalmente quando alguém adquire um carro usado, promove pesquisa junto ao Detran para saber se existe restrição (bloqueio). Essa cautela realmente deve ser sempre adotada. Se o negócio foi firmado e já existia bloqueio, dificilmente o comprador não será atingido pelo reconhecimento judicial da fraude. Isso porque com o lançamento da restrição se presume que todos dela passam a ter conhecimento.

Acontece que pode existir execução em trâmite e a justiça ainda não ter deliberado pelo bloqueio ou mesmo a determinação ainda não ter sido recebida na repartição de trânsito ou ainda não ter sido lançada. Qualquer que seja o contexto, a inexistência de bloqueio formal nem sempre significará paz para o comprador. Isso porque o terceiro interessado poderá ajuizar pedido tendente à comprovação de que o comprador estava mancomunado com o vendedor do automóvel, ou seja, de que ambos ajustaram negócio justamente para frustrar os credores deste último. A avaliação da existência ou não de boa-fé do comprador dependerá da análise de detalhes de cada caso.

Via de regra, a existência de má-fé por parte de quem compra será, como dito, analisada. Todavia, se o vendedor do veículo for devedor do fisco (tributos), ou seja, se contra ele já tiver sido expedida certidão de dívida ativa, existindo ou não ação de execução fiscal, a negociação do bem será fatalmente afetada, independentemente de nada constar no cadastro do Detran. Isso porque o artigo 185 do Código Tributário, alterado pela Lei Complementar 118/2005, determina: “Presume-se fraudulenta a alienação ou oneração de bens ou rendas, ou seu começo, por sujeito passivo em débito para com a Fazenda Pública, por crédito tributário regularmente inscrito como dívida ativa”, a não ser que tenham sido reservados, pelo devedor, bens ou rendas suficientes ao total pagamento. Conforme já decidiu, “a diferença de tratamento entre a fraude civil e a fraude fiscal justifica-se pelo fato de que, na primeira hipótese, afronta-se interesse privado, ao passo que, na segunda, interesse público, porquanto o recolhimento dos tributos serve à satisfação das necessidades coletivas” (STJ, Recurso Especial 1.141.990/PR, Rel. Min. Luiz Fux, julgado aos 10/11/2010). O ideal, portanto, é pesquisar se o vendedor deve tributos e recorrer não só aos cadastros do Judiciário, mas também das repartições públicas...

Portanto, esteja sempre muito atento e escolha muito bem com quem vai negociar! Às vezes o que parece barato se torna muito caro!

Adriano Rodrigo Ponce de Oliveira
Juiz de Direito / Professor no Unisalesiano
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