Quem sou eu

Juiz de Direito desde 2007. Titular do Juizado Especial Cível de Lins(SP). Ex-Professor do Curso de Direito do Unisalesiano em Lins(SP). Ex-delegado de polícia. Motociclista, tatuado e corintiano do "bando de loucos".

11 de set. de 2013

Comunicação não-violenta (CNV)

            O problema da comunicação (ou da falta ou ineficácia dela) nem sempre é tratado com a atenção que merece. O tema está umbilicalmente ligado ao adequado desempenho das atividades profissionais e à prevenção e solução de conflitos familiares e sociais.
            Não é difícil alguém se gabar de não ser violento tão-somente pelo fato de nunca ter ofendido a integridade física de outrem. Acontece que a violência se manifesta das mais variadas formas, inclusive pela maneira como a pessoa se expressa. E nem sempre é fruto de uma reação deliberada, mas de um jeito inadequado de reagir, do não saber ouvir, refletir e expor.
            É preciso ter em mente que “um golpe de açoite produz contusões, mas um golpe de língua quebra os ossos” (Eclesiástico, 28:17).
            Emmanuel, por meio de Francisco Cândido Xavier, assim se pronunciou: “É possível que o constrangimento do companheiro tenha surgido do gesto impensado de tua parte. O gracejo impróprio ou o apontamento inoportuno teria tido o efeito de um golpe. Decerto, não alimentaste a intenção de ferir, mas a desarmonia partiu de bagatela, agigantando-se em conflito de grandes proporções. De outras vezes, a mente adoece, conturbada. Teremos ofendido, realmente. A cólera ter-nos-á cegado o discernimento e brandimos o tacape da injúria. Pretendemos aconselhar e cortamos o coração de quem ouve. Alegando franqueza, envenenamos a língua. No pretexto de consolar, ampliamos chagas abertas. E começa para logo a distância e a aversão ... Humildade é caminho. Entendimento é remédio. Perdão é profilaxia. Muitas vezes, loucura e crime, dispersão e calamidade nascem de pequeninos desajustes acalentados. Não hesites rogar desculpas, nem vaciles apagar-te, a favor da concórdia, com aparente desvantagem particular, porquanto, na maioria dos casos de incompreensão, em que nos imaginamos sofrer dores e ser vítimas, os verdadeiros culpados somos nós mesmos” (Justiça Divina, capítulo 6).
            A técnica da CNV tem sido muito difundida para aprimorar relacionamentos e promover conciliações por Marshall B. Rosenberg, autor de livro com o mesmo título (Ed. Ágora). Traduz-se em quatro fases: (1) Observação isenta (sem crítica ou diagnóstico) do que nos agrada ou não no comportamento do outro; (2) Identificação do sentimento que determinada postura nos gera; (3) Individualização precisa que poderia ser feito para melhorar o convívio; (4) Formulação clara do pedido; indicação de ações concretas. São, portanto, componentes da CNV: observação, sentimento, necessidades e pedido. Segundo o autor, quem não expressa honestamente seu sentimento favorece interpretação equivocada. Mas isso tem de ser feito sem avaliações, pois se a manifestação tiver expressão de crítica o outro poderá investir a energia dele em autodefesa ou contra-ataque, ou seja, não reagirá da forma desejada. O pedido sem referência ao sentimento e à necessidade que o fundamentaram poderá soar como exigência. Deve haver sinceridade e empatia (compreensão respeitosa do que o outro está vivendo, sem idéias preconcebidas). Às vezes pode ser interessante confirmar se o outro realmente entendeu o que você quis dizer.
            Rosenberg admite que na prática nem sempre é tão simples administrar emoções e conseguir percorrer todas essas etapas. Mas adverte que o treinamento poderá surtir resultados muito positivos. Propõe uma forma de comunicação que nos leve a nos entregarmos de coração, de forma compassiva. Sugere reformulação da maneira como nos expressamos e como ouvimos os outros. Recomenda atenção com aquilo que denomina de “comunicação alienante da vida” e enumera modalidades que nos afastam do nosso estado natural de compaixão, dentre elas: (a) Julgamentos moralizadores motivados apenas por comportamentos que estão em desacordo com nossos juízos de valor (como se fossemos “donos da verdade”); (b) Comparações, que invariavelmente fazem surgir infelicidade, já que sempre haverá um aspecto em relação ao qual nos sentiremos inferiores ao outro (beleza, inteligência, condição socioeconômica etc.); (c) Negação de responsabilidade pelos nossos comportamentos, pensamentos e sentimentos e a tentativa de imputar a culpa a outrem, o que nos torna perigosos.
            É muito importante que estejamos atentos aos sentimentos violentos que surgem na nossa mente e que admitamos as nossas limitações, pois essa compreensão certamente nos conduzirá a um estado mental mais pacífico, com todos os benefícios inerentes.
Adriano Rodrigo Ponce de Oliveira
Juiz de Direito em Penápolis(SP)
Professor no Unisalesiano
(publicado na Revista Comunica de set/2013)