Quem sou eu

Juiz de Direito desde 2007. Titular do Juizado Especial Cível de Lins(SP). Ex-Professor do Curso de Direito do Unisalesiano em Lins(SP). Ex-delegado de polícia. Motociclista, tatuado e corintiano do "bando de loucos".

28 de ago. de 2014

Conciliação – luz no fim do túnel...

Aos 22/8/2014 inauguramos, em Penápolis(SP), o Centro Judiciário de Solução de Conflitos e Cidadania (Cejusc).
Atuarão, de forma graciosa, vários advogados conciliadores.
Na prática, muitas questões, especialmente relacionadas ao Direito de Família (pensão alimentícia, guarda, divórcio, reconhecimento e dissolução de união estável), bem como cobranças diversas, acabam sendo resolvidas sem a necessidade de produção de prova e o índice de composições nessa seara sempre foi elevado.
Em boa parte dos casos a presença do Magistrado acaba sendo desnecessária, já que muitos acordos acabam se desenhando antes mesmo das audiências, nos corredores do Fórum. Costumo dizer que às vezes a presença do juiz pode até atrapalhar porque as pessoas não se sentem à vontade para “lavar a roupa suja”. Em alguns casos a parte quer mesmo é desabafar e depois acaba se sujeitando ao acordo...
Os conciliadores compromissados atuarão sob a coordenação do juiz Heverton Rodrigues Goulart, titular do Juizado Especial local.
A tentativa de conciliação poderá acontecer em qualquer fase do processo ou mesmo antes do ajuizamento, mediante convite para uma conversa sem as formalidades inerentes às ações judiciais. Inclusive as pessoas jurídicas poderão se servir dessa estrutura.
Na hipótese de composição, o termo, depois de ouvido o Ministério Público (nos casos em que deva intervir), será remetido à homologação judicial. Se não houver acordo o rito processual será retomado e/ou as partes receberão as orientações necessárias.
A composição (acordo), porque deriva da vontade das partes, tende a ser mais bem assimilada e cumprida do que a decisão judicial, motivo pelo qual conta com a simpatia e o incentivo do Conselho Nacional de Justiça, dos Tribunais superiores e especialmente do nosso Tribunal de Justiça e da Secção paulista da Ordem dos Advogados.
Estou certo de todos ganharão: o jurisdicionado que firmar acordo terá rápida solução para o seu caso; as demandas que não podem ser submetidas à conciliação terão maior atenção do magistrado e maior espaço na pauta; e os advogados serão beneficiados com a maior celeridade.
Não é novidade que a estrutura do Poder Judiciário está muito aquém do volume de demandas (pois não vem recebendo as verbas que deveria) e que o grau de litigiosidade tem se intensificado assustadoramente, o que sugere que o problema tende a se agravar.
Já é hora de os Tribunais pensarem na criação de cargos de conciliadores remunerados. A medida não implicaria no mesmo impacto financeiro que muitas vezes emperra a contratação de juízes; geraria oportunidades para bacharéis em Direito; propiciaria a padronização de procedimentos e, sem dúvida, traria um novo fôlego à sufocada sistemática vigente.
De qualquer forma, o Cejusc, que está de “casa nova” na Av. Olsen, nº 300, na quadra da Escola Augusto Pereira de Moraes, já é muito bem-vindo!
Adriano Rodrigo Ponce de Oliveira
Juiz de Direito e Professor no Unisalesiano
(publicado no Diário de Penápolis aos 28/8/2014)

3 de ago. de 2014

Curso de Técnico em Serviços Jurídicos

Por três vezes já estive conversando com alunos da Habilitação Profissional Técnica de Nível Médio de Técnico em Serviços Jurídicos do Centro Paula Souza. Sempre me senti muito bem naquele ambiente.
Interessei-me por conhecer melhor o curso. As unidades de Lins e Sabino contam atualmente com cerca de 150 alunos. Tudo começou em Lins no segundo semestre de 2009 e a cada um ano e meio uma turma conclui o curso. A cada semestre a procura tem aumentado e a concorrência tem sido de três a cinco candidatos por vaga.
Tive a satisfação de descobrir que o curso foi criado em atenção à solicitação do Tribunal de Justiça de São Paulo, então “preocupado com a funcionalidade da qualificação dos serventuários que atuam diretamente na atividade-fim do Poder Judiciário”. Posteriormente, foi disponibilizado para o público em geral. Visa a preparar o aluno para entender e trabalhar nas rotinas de um departamento jurídico ou de um escritório de advocacia e dar suporte técnico-administrativo a advogados, auditores e outros profissionais do ramo. A proposta do curso deixa claro que o Técnico em Serviços Jurídicos não se confunde com o estagiário de Direito, pois desenvolve seu trabalho de forma mais independente: não se limita ao aprendizado técnico-pedagógico orientado.
A implantação do curso foi uma grata surpresa! Afinal, outros cursos superiores já contavam com formação técnica no mesmo ramo, como a Enfermagem e a Engenharia.
Por meio dele o estudante tem condições de conferir se realmente é vocacionado para a futura graduação em Direito e desenvolver a capacidade de refletir, de se posicionar diante de uma controvérsia e de expor a sua opinião respeitando a contrária. Debates sobre temas cotidianos estimulam a sensatez. E ainda que não pretenda prosseguir no ramo, mas apenas enriquecer os seus conhecimentos, o estudante adquirirá informações extremamente úteis para bem conduzir a sua vida e orientar seus pares. Por fim, frequentar o curso pode significar um diferencial na busca por cargos públicos que exigem conhecimentos jurídicos (Escrevente, Oficial de Justiça, Escrivão, cartorário etc.).
Essa formação técnica é de suma importância também para os Cursos de Direito, na medida em que seus futuros alunos já chegarão à universidade com uma importante base teórica e sabedores de que a opção pela formação jurídica requer muita leitura e aprimoramento continuado por toda a vida profissional. Além disso, no Curso Técnico o aluno tem condições de desenvolver oratória e redação, submeter-se a um trabalho de conclusão de curso e participar de aulas práticas, além de desmistificar diversas informações equivocadas que o leigo e até mesmo os meios de comunicação costumam divulgar sobre questões jurídicas.
Por tudo isso, entendi que deveria destacar o referido curso, bem como o empenho com que vem sendo conduzido pelos formadores.
Quanto ao corpo discente, tal como já enfatizei na palestra motivacional e sobre carreiras jurídicas que ministrei, é composto de pessoas que considero vencedoras e diferenciadas, pois o curso não substitui o ensino médio, que em verdade é pré-requisito para a sua conclusão. Em suma: quem busca o curso quer realmente ampliar seus horizontes; está realmente interessado em aprender, o que tem refletido na qualidade do ensino e motivado os professores.
A comunidade, como se vê, tem ao seu dispor, gratuitamente, uma excelente oportunidade de construir um futuro melhor.
Adriano Rodrigo Ponce de Oliveira
Juiz de Direito e Professor universitário
(publicado no Correio de Lins - ago/2014)

Internação compulsória

Um dos momentos mais tensos da existência de uma família é aquele em que se torna necessária a adoção de medida judicial para a internação de um filho dependente de drogas.
Esse tipo de ação infelizmente tem se tornado cada vez mais comum. As drogas estão se disseminando com muita rapidez. E a incapacidade para dialogar também tem avançado na mesma velocidade.
A depender da personalidade e do grau de dependência do indivíduo, a intervenção pode acabar sendo a única solução para a preservação da sua integridade física e, em alguns casos, até mesmo da sua vida. Não raramente familiares também correm risco durante crises de agressividade.
A tramitação da ação de internação compulsória é relativamente simples.
A Lei Federal 10.216/2001 dispõe sobre a proteção e os direitos das pessoas portadoras de transtornos mentais. Enfatiza a necessidade de que sejam tratadas com humanidade e respeito, tudo a fim de que se recuperem e sejam inseridas família, no trabalho e na comunidade. Prevê direito de acesso aos meios de comunicação e às informações sobre a doença e o tratamento. E ressalta que devem ser utilizados os “meios menos invasivos possíveis”.
A norma exige laudo médico circunstanciado que aponte, com clareza, a imprescindibilidade da internação. Se ela for determinada, o paciente deverá ser reavaliado frequentemente.
Na prática há poucos estabelecimentos habilitados à internação de dependentes de drogas. E essa medida extrema, torno a ressaltar, somente se justifica se os recursos extra-hospitalares se mostrarem insuficientes.
Na Comarca de Penápolis(SP), por ex., a Justiça costuma recorrer ao competente Hospital Espírita, que há décadas cuida de portadores de transtornos mentais. Ocorre que a grande demanda exige rotatividade de leitos e o estabelecimento de prioridades. Passado algum tempo (nem sempre o que seria desejável), o dependente, por conta da falta de contato com a droga e da medicação prescrita, vai melhorando, quando então surgem propostas de que o tratamento continue em regime ambulatorial. Acontece que o retorno do paciente ao convívio social às vezes implica na retomada do contato promíscuo com outros dependentes e traficantes e ao retorno ao estado anterior.
Quando a família tem condição socioeconômica mais favorecida ou recebe apoio financeiro de terceiros, costuma eleger clínica especializada. Acontece que tais clínicas não impõem aos pacientes, e nem poderiam, um regime penitenciário. As fugas podem acontecer e sempre acontecem. E, se não houver suficiente fiscalização, o paciente pode ter contato com a droga no próprio local, muitas vezes com a ajuda de outro paciente. O que não se pode negar, todavia, é que nas clínicas o tratamento pode ser mais longo e o ambiente pode ser mais propício.
A lição que fica é que a família deve apostar todas as cartas na tentativa de convencimento do dependente para que ele aceite o seu problema e a sua impotência para lutar sozinho contra a dependência. A busca por tratamento ambulatorial ou até mesmo a internação voluntária, justamente pela adesão do paciente, costumam surtir mais resultados.
Procuro, sempre que possível, designar audiência para conhecer melhor o dependente e saber do seu interesse em ser tratado, pois às vezes é possível fazer uma espécie de acordo para tratamento ambulatorial e monitorá-lo durante algum tempo.
Como se vê, o diálogo acaba sendo a ferramenta mais importante de todo esse processo. Em grande parte dos casos os familiares não estão suficientemente preparados para isso, ainda que sejam bem esclarecidos sobre outros assuntos. Isso é natural, pois não existe uma fórmula pronta para tirar alguém do vício e o emocional fica abalado. O que não se discute é que o dependente, que normalmente é depressivo, precisa de acolhimento, franqueza e resgate da autoestima. Precisa se sentir importante e não um tormento para os familiares. Por meio de uma boa conversa pode ser possível detectar as reais causas da entrega às drogas, pois nem sempre elas estão visíveis. Os familiares devem agir de uma forma organizada, planejada. Não adianta todo mundo falar ao mesmo tempo e nem fazer acusações ao paciente ou abordá-lo com hostilidade. Por isso, eles devem se preparar. E quando a gente tem de fazer algo desconhecido, deve buscar orientação com quem já tem experiência no assunto. Procurar familiares de pacientes que superaram a dependência pode ser interessante para trocar idéias, muito embora o método que utilizaram possa não vir a ser totalmente aproveitado. De forma concomitante, os familiares devem buscar apoio psicológico. Já existem, inclusive, grupos de apoio voltados especificamente à orientação dos familiares. Por mais que se julguem “fortes” e experientes, normalmente são debutantes no enfrentamento desse tipo de problema...
O combate à dependência é lento e imprevisível, mas quando se tem informação, paciência, perseverança, método e, sobretudo, fé, pode mudar a vida de todo o grupo familiar. Só não vale desesperar...
Adriano Rodrigo Ponce de Oliveira
Juiz de Direito e Professor universitário
(publicado na Revista Comunica - edição ago/2014)