De maneira geral, a apuração de um crime começa na
primeira instância, onde o caso é julgado por um magistrado estadual ou federal
(a depender do delito), ou seja, submetido a um juízo monocrático. Cabe recurso
para um grupo de desembargadores do tribunal estadual ou federal ou mesmo para
um grupo de juízes do Colégio Recursal (no caso de delito de menor potencial
ofensivo). A análise na segunda instância, portanto, é feita por um juízo
colegiado e prevalece a decisão da maioria. Em algumas situações excepcionais,
podem ser admitidos recursos aos chamados tribunais superiores: recurso especial
ao Superior Tribunal de Justiça e/ou recurso extraordinário ao Supremo Tribunal
Federal. Tais recursos, porém, não possuem efeito suspensivo, ou seja, o ato de
recorrer, por si só, não suspende a decisão do tribunal inferior.
A Constituição Federal trata do princípio da
presunção da inocência (ou presunção da não-culpa, como alguns preferem) no artigo
5º, inciso LVII: “ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de
sentença penal condenatória”. O trânsito em julgado acontece quando não cabe mais
recurso da condenação.
O Supremo Tribunal Federal vinha decidindo pela impossibilidade
cumprimento de pena antes do trânsito em julgado. Afinal, alguns réus
conseguiam absolvições no STJ e no STF. Mas sempre houve quem defendesse que um
percentual muito pequeno de absolvições não justificava que a maciça maioria de
criminosos continuasse se servindo de recursos (muitos, desprovidos de bons
argumentos) para protelarem o cumprimento das suas penas, em prejuízo de toda a
coletividade.
Aos 17/2/2016, por ocasião do julgamento do “Habeas
Corpus” 126.292/SP, os onze ministros do Supremo, por maioria (7x4), alteraram o
entendimento do colegiado e decidiram que nada impede o início da execução da
pena imposta pela segunda instância, ainda que o acusado recorra para o STJ ou
para o próprio STF.
O Ministro Lewandowski, que tinha ficado vencido
naquela votação, ao presidir o plantão judiciário de julho, sob o argumento de
que a prisão, na pendência de julgamento de recurso, é ofensiva ao princípio da
presunção da inocência, autorizou a soltura de um prefeito nos autos do “Habeas
Corpus” 135.752. Entretanto, ao assumir
a presidência desse processo, o Ministro Edson Fachin revogou a ordem de
libertação e confirmou a possibilidade de cumprimento da pena.
Fachin, ao reafirmar a tese adotada em fevereiro,
salientou que as instâncias
ordinárias sempre esgotam o exame de fatos e provas e que a definição de culpa por
um juiz e, em seguida, por “pelo menos três magistrados em estágio adiantado de
suas carreiras”, é bastante para o início do cumprimento da pena. Prestigiou os
tribunais inferiores: “As instâncias ordinárias, portanto, são soberanas no que
diz respeito à avaliação das provas e à definição das versões fáticas apresentadas
pelas partes”. Resumiu a posição mais recente do Supremo: “Em razão disso,
fixou-se a tese no sentido de que: ‘A execução provisória de acórdão penal
condenatório proferido em grau de apelação, ainda que sujeito a recurso
especial ou extraordinário, não compromete o princípio constitucional da
presunção de inocência”. Ressaltou que era necessário que a mais alta Corte do
País se mantivesse coerente com o que a maioria tinha resolvido. Ponderou que
não permitir o cumprimento de pena definida por tribunal significaria “conferir
efeito paralisante à eficácia de absolutamente todas as condenações criminais
assentadas em segundo grau”.
Há sedutores argumentos em ambos os sentidos. De
qualquer forma, ainda que seja cedo para dizer que o Supremo pacificará o debate,
parece provável que a possibilidade de cumprimento da pena depois de condenação
em segunda instância passe mesmo a ser amplamente reconhecida.
Estejamos atentos!
Adriano Rodrigo Ponce de
Oliveira
Juiz de Direito
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(publicado na edição de 11/8/2016
do Diário de Penápolis)
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