Quem sou eu

Juiz de Direito desde 2007. Titular do Juizado Especial Cível de Lins(SP). Ex-Professor do Curso de Direito do Unisalesiano em Lins(SP). Ex-delegado de polícia. Motociclista, tatuado e corintiano do "bando de loucos".

1 de set. de 2012

Meia-entrada: direito do estudante

Meia-entrada: direito do estudante
         A Medida Provisória 2.208, de 17/8/2001, dispõe sobre o desconto a que fazem jus os estudantes para o ingresso em estabelecimentos de diversão e eventos culturais, esportivos e de lazer. Prevê que a comprovação da condição de estudante será feita pela exibição de documento de identificação estudantil expedido pelos correspondentes estabelecimentos de ensino ou pela associação ou agremiação estudantil a que pertença, inclusive pelos que já sejam utilizados, vedada a exclusividade de qualquer deles. Por força da Emenda Constitucional 32/2001, essa medida provisória continua em vigor, com força de lei.
         A maioria dos estados brasileiros já editou lei estadual regulamentadora da meia-entrada. Em São Paulo, nos termos da Lei Estadual 7.844/1992, todo aluno regularmente matriculado em estabelecimentos de ensino de ensino fundamental, médio e superior, paga meia em cinemas, circos, espetáculos teatrais, esportivos, musicais e de lazer em geral. No caso de estudantes que residam no município de São Paulo, a Lei Municipal nº 13.715/2004 estendeu o concessão aos alunos matriculados em cursos profissionalizantes (básico e técnico), pré-vestibulares e pós-graduação.
         A Lei Estadual 7.844/1992 determina: “Caberão ao Governo do Estado de São Paulo, através dos seus respectivos órgãos de cultura, esporte, turismo e defesa do consumidor, e, nos Municípios, aos mesmos órgãos das referidas áreas, bem como ao Ministério Público do Estado de São Paulo, a fiscalização e o cumprimento desta lei”.
         Ela foi regulamentada pelo Decreto Estadual 35.606/1992, que dispõe: “consideram-se casas de diversão pública, para efeito desse decreto, os estabelecimentos que apresentem espetáculos teatrais, musicais, culturais, circense, exibição cinematográfica, cultural e desportiva, bem como as praças esportivas e similares em que sejam realizados eventos culturais, desportivos e de lazer no Estado de São Paulo”. O Decreto enfatiza que “o pagamento de meia-entrada, será obtido tomando-se por base o valor efetivamente cobrado”. Estende o benefício “aos estudantes de primeiro, segundo e terceiro graus regularmente matriculados em estabelecimentos de ensino público e particular existentes no Estado. Chegou a estabelecer que o exercício do direito dependia da “apresentação da Carteira de Identificação Estudantil – CIE”, “emitida pela União Nacional dos Estudantes - UNE – ou pela União Brasileira dos Estudantes Secundaristas – UBES”, mas neste particular prevalece a Medida Provisória 2.208, que proibiu a exclusividade de organizações na emissão das identidades estudantis. Enfatiza: “os órgãos estaduais diretamente envolvidos com as atividades de cultura, esporte, turismo e de defesa do consumidor prestarão a colaboração necessária à fiscalização e ao fiel cumprimento deste regulamento”, o que não tenho visto acontecer.
Diante da recusa indevida, o estudante pode pleitear o ressarcimento do equivalente ao desconto por meio do Procon ou do Poder Judiciário. Deve comprovar a aquisição pelo preço integral, e, se for o caso, exigir nota fiscal. Deve analisar a necessidade de acionar a Polícia.
A prática de proporcionar meia-entrada para todos, mediante arrecadação de alimentos ou publicação de cupons de desconto em jornais, constitui fraude ao direito dos estudantes. Isso aconteceu recentemente no show de Ary Toledo em Penápolis(SP). Na prática, as pessoas que promovem shows acabam fixando um preço equivalente ao dobro daquilo que pretendem receber e publicam centenas de anúncios de jornais, sabedoras de que os interessados os apresentarão. Muitas vezes os recortes nem são exigidos. Dessa forma, os promotores dos eventos acabam vendendo os ingressos a todos (inclusive aos estudantes) pelos preços que efetivamente desejavam receber. E os estudantes acabam, na prática, não pagando meia-entrada...
Em alguns cinemas, parece-me ilegal a fixação de um preço normal, de um preço com desconto para os que pagam ingresso integral, e de um preço para estudante equivalente a metade daquele primeiro preço normal. Ex. Preço normal de R$ 10,00; preço de R$ 8,00 com “desconto” para não-estudantes (indistintamente) e preço de R$ 5,00 para estudantes. O correto é que estudantes paguem metade do valor efetivamente cobrado dos não-estudantes, no caso do exemplo, R$ 4,00. Esse “desconto” não mais é do que uma fraude.
         É preciso esforço conjunto para fazer valer o direito dos estudantes. E é necessário que eles sejam informados e exijam o respeito ao seu direito. Na recente festa de rodeio de Cafelândia(SP), por exemplo, esse direito foi “atropelado” pela comissão organizadora. No último dia presenciei uma discussão na portaria e decidi intervir em favor de três estudantes do Distrito de Bacuriti, que, de posse da medida provisória, apenas desejavam o desconto. Fui atendido por integrantes da comissão, que acabaram se convencendo e vendendo as meias-estradas. Mas já era tarde e muitos estudantes pagaram R$ 20,00, quando deveriam ter pagado R$ 10,00. A diferença era significativa. E mais do que o valor, o que causou indignação foi a supressão do direito, a injustiça.
         Talvez fosse o caso de os poderes constituídos, quando emitissem alvarás para eventos, já ressaltassem a necessidade de observância das citadas regras e até mesmo a afixação delas nas bilheterias. E seria interessante, também, que sempre que os órgãos de comunicação fossem divulgar eventos, entrevistassem os seus organizadores, expressamente, também sob o enfoque da observância do direito à meia-entrada, questionando-os sobre os direitos dos estudantes. Assim, muitos conflitos seriam evitados.
Adriano Rodrigo Ponce de Oliveira
Juiz de Direito Diretor do Fórum e titular da 2ª Vara de Penápolis(SP)
(publicado no Correio de Lins de 31/5/2011, no Jornal Regional de 29/5/2011,
 no Jornal Cidade de 29/5/2011 e na edição de  junho de 2011 da Revista Tempo a Tempo)