Quem sou eu

Juiz de Direito desde 2007. Titular do Juizado Especial Cível de Lins(SP). Ex-Professor do Curso de Direito do Unisalesiano em Lins(SP). Ex-delegado de polícia. Motociclista, tatuado e corintiano do "bando de loucos".

28 de jul. de 2014

Freios e contrapesos

            Segundo a Constituição Federal, “são Poderes da União, independentes e harmônicos entre si, o Legislativo, o Executivo e o Judiciário” (art. 2º).
            Várias disposições constitucionais materializam o chamado sistema de “freios e contrapesos” (checks and balances), idealizado para que haja divisão de tarefas e equilíbrio entre os Poderes, ou seja, para que possam se controlar mutuamente. O Judiciário, por ex., está sujeito às leis editadas pelo Legislativo, mas também pode reconhecer a inconstitucionalidade de alguma delas. Alguns de seus membros são escolhidos pelo Executivo. O Legislativo depende de sanção para que determinada norma surta efeitos jurídicos. O Executivo depende de autorização legislativa para algumas ações e eventuais abusos podem ser coibidos pelo Judiciário. São muitas as previsões que tratam de competências, atribuições e limitações de poder. Cada um dos Poderes exerce funções típicas e atípicas. E o Ministério Público exerce importante papel na preservação desse sistema e na prevenção e repressão de ilegalidades.
            Na nossa vida também é assim... Cada um sempre estará sujeito à fiscalização, ao controle e à repressão dos excessos que possam colocar em risco o direito do outro. Essa contenção atinge detentores de cargos públicos e também cidadãos comuns. As sanções podem ou não estar legalmente previstas. Às vezes a censura ao abuso é feita apenas socialmente, mas nem por isso é menos contundente. A desaprovação social pode machucar mais do que uma condenação. Com o passar dos anos e o amadurecimento pessoal e profissional a gente tem cada vez mais certeza disso...
            Daí a importância de o jovem estudante começar a refletir desde já para o fato de que estará sujeito às “regras do sistema”, independentemente da carreira profissional que eleger.  Ainda que se torne um vencedor em determinada área, deverá sempre ter a humildade de reconhecer que nunca será o dono da verdade e que sempre terá de dar satisfações a alguém. Nunca deverá se deslumbrar; permitir que a sua visão seja distorcida... Terá de reconhecer erros, de se aconselhar, de perguntar e de se curvar à sabedoria e à autoridade do outro.
            Segundo trecho de certa música dos Racionais, “a mãe dos pecado capital é a vaidade” (sic). Talvez esse realmente seja um dos principais defeitos que alguém possa manifestar. Não estou a sustentar que o indivíduo não deva se sentir feliz por determinada conquista pessoal ou profissional. Refiro-me especificamente ao comportamento soberbo, arrogante, que por vezes alguns profissionais adotam porque, iludidos, acabam concluindo que são insubstituíveis; que o outro é obrigado a tolerar o seu comportamento porque supostamente é dependente da sua atuação; que nada pode lhe deter.
            A vaidade excessiva deturpa a personalidade e corrói relações pessoais e profissionais. Por vezes torna o convívio insuportável. Quando não afasta o indivíduo do convívio porque, na prática, os demais são obrigados a toleraram a sua presença, o torna alvo de gozações, insubordinações, desdém e outros comportamentos negativos. E quando ele se vai, não deixa saudade...
            A consequência disso é que como “o mundo dá voltas”, se as circunstâncias da vida lhe provocarem perdas, provavelmente não será amparado e sequer ouvido, o que agravará ainda mais o seu estado.
            É preciso que estejamos sempre atentos ao nosso comportamento e cientes de que sempre necessitaremos do outro. Sempre haverá o mais inteligente, o mais bonito, o mais forte, o mais poderoso, o mais rico, o mais sábio, o mais ágil, o mais simpático, o mais eficiente, o mais admirado, o mais esperto, o mais premiado etc. E que bom que é assim, não é mesmo? Sem esses “freios e contrapesos”, o que seria da nossa sociedade? O que seria de nós? Como nos suportaríamos? Dito isso, é sempre bom ficar atento, pois o sistema costuma cobrar caro dos que cometem deslizes. A vaidade excessiva pode ser um caminho sem volta...
Adriano Rodrigo Ponce de Oliveira
Juiz de Direito / Professor no Unisalesiano

(publicado na Revista Comunica – edição de julho de 2014)