A Comarca de Penápolis ainda não
adotou o chamado “processo digital”, ao contrário do que já aconteceu em Lins e
Birigui.
Muito embora todas estejam
classificadas na entrância intermediária (sejam do mesmo “nível”), em Penápolis
funcionam quatro varas de competência cumulativa, enquanto que nas outras operam
três varas cíveis e duas varas criminais. Em todas também existem Juizados.
Contamos, portanto, com uma vara
a menos e por isso não pudemos concretizar a tão sonhada especialização da
competência. Quando o juiz atua somente na área criminal ou apenas na área
cível a sua produtividade aumenta. Fica mais fácil se atualizar. Ele não
enfrenta tantas oscilações de raciocínio. Ao contrário, quando atua numa vara
de competência cumulativa (cível e criminal), o juiz enfrenta uma variedade
muito grande de assuntos. Diante da complexidade e da vastidão do Direito, isso
dificulta bastante o trabalho. É como se o juiz fosse um “clínico geral”. A
diferença com a carreira médica é que o juiz não pode fazer o primeiro
atendimento e encaminhar o caso para o especialista. Tem de seguir decidindo
até o fim. Tem de ser “especialista em quase tudo”...
Em Penápolis, que não conta com
Justiça Federal, os magistrados ainda presidem milhares de ações previdenciárias
(demandas ajuizadas contra o INSS para a obtenção dos mais variados
benefícios).
As sete cidades da Comarca de
Penápolis (Penápolis, Alto Alegre, Avanhandava, Barbosa, Braúna, Luiziânia e
Glicério), segundo estimativa do IBGE para 2014, devem possuir 101.097
habitantes. As três cidades da Comarca de Lins (Lins, Guaiçara e Sabino), por
sua vez, devem totalizar 92.600 habitantes.
Na Comarca de Penápolis cada um
dos cinco juízes estaduais responde por 20.219 habitantes. Na Comarca de Lins
cada um dos seis juízes estaduais responde por 15.433 habitantes. Em Lins já
existe Vara e Juizado Federais. Como a Justiça Estadual, em razão disso, não
absorve causas de competência federal, é possível dizer que, em verdade, o
mesmo trabalho desempenhado em Penápolis por cinco juízes e feito em Lins
(Comarca menor) por pelo menos sete juízes, ou seja, que cada um deles responde
por 13.228 habitantes, realidade bem diferente da nossa!
Cada magistrado de Penápolis
preside cerca de 15.000 processos (incluídas as mais de 38.600 execuções
fiscais que dividem).
Em resumo, 20.219 habitantes
desaguam seus problemas (exceto os de ordem trabalhista e puramente federais),
por meio de 338 advogados (contando apenas os inscritos na OAB de Penápolis),
de cinco Promotores de Justiça e de várias autoridades policiais, num cartório
judicial onde trabalham em média 15 pessoas; que, por sua vez, movimentam esses
processos para que um juiz resolva questões de todos os graus de complexidade e
relativas a quase todas as disciplinas jurídicas. O afunilamento é
impressionante, não é mesmo? Quem dá conta? Quem se habilita?
Quando o processo digital for
implantado em Penápolis, tudo isso acontecerá “virtualmente”. Ações serão
ajuizadas de qualquer lugar, a qualquer hora, sem que papéis tenham de ser
juntados e sem que os autos tenham de ser transportados ao juiz, procedimentos
que, se por um lado geram alguma demora, permitem que o escrivão selecione o
que precisa ser apreciado com mais urgência. A consequência é que a “caixa de
entrada” do juiz, semelhante àquela que acumula e-mails, acumulará, durante 24 horas por dia, questões a serem
decididas, independentemente do grau de complexidade e de urgência.
Nesse dia, com o devido respeito,
eu desejo que já não esteja por aqui... Para mim “fazer justiça” não combina
com números. O trabalho do Judiciário cada vez mais tem sido visto apenas sobre
o enfoque quantitativo, como se uma decisão apressada não pudesse destruir os
sonhos de alguém. Existe muita preocupação com tecnologia, mas se esquecem de
que aquele que tem de decidir é um ser humano e não uma máquina.
Com o processo digital, haverá
economia, praticidade, mas o que a Justiça precisa mesmo, além da
conscientização das pessoas de que nem tudo deve ser objeto de ajuizamento, é
de mais juízes; de que eles tenham
mínimas condições para bem desempenharem o seu mister; de que tenham mais serenidade
para lidar com as sensíveis questões submetidas ao seu crivo, o que tem
acontecido cada vez menos... Do jeito que está, a perspectiva é a de que, por
mais que nos empenhemos, com o processo digital a fila aumente ainda mais, a
não ser que comecemos a decidir “de qualquer jeito”, solução que me recuso a
adotar, pois geraria produtividade em números, mas feriria o juramento que fiz e,
pior ainda, a minha consciência, além, é claro, de só agravar conflitos.
Adriano Rodrigo Ponce de Oliveira
Juiz de Direito / Professor no
Unisalesiano
Facebook Adriano Ponce Jurídico
(publicado no Diário de Penápolis
de 22/1/2015 e também no Correio de Lins)