Quem sou eu

Juiz de Direito desde 2007. Titular do Juizado Especial Cível de Lins(SP). Ex-Professor do Curso de Direito do Unisalesiano em Lins(SP). Ex-delegado de polícia. Motociclista, tatuado e corintiano do "bando de loucos".

12 de abr. de 2015

Deveres dos garagistas


            A Lei 13.111 foi publicada no dia 26/3/2015 e entrará em vigor decorridos 60 dias da publicação.
            Obriga revendedores de veículos automotores novos ou usados, inclusive os chamados “garagistas”, a informarem ao comprador:
            I - o valor dos tributos incidentes sobre a comercialização do veículo;
            II - a situação de regularidade do veículo quanto a: (a) furto; (b) multas e taxas anuais legalmente devidas; (c) débitos de impostos; (d) alienação fiduciária; (e) quaisquer outros registros que limitem ou impeçam a circulação do veículo.
            A lei poderia ter sido mais abrangente. Em vez de ter referenciado apenas furto, poderia ter tratado de qualquer espécie de crime patrimonial (para englobar roubo e estelionato, por ex.). De qualquer forma, quando mencionou a necessidade de ciência ao comprador de “quaisquer outros registros que limitem ou impeçam a circulação”, abarcou restrições administrativas (impostas pela autoridade de trânsito), como as relacionadas a danos de grande monta decorrentes de acidentes (caso em que é preciso verificar se o veículo foi devidamente reparado e está em condições de circulação); bem como restrições judiciais (bloqueio para efetivação de penhora, por conta de medida cautelar, para busca e apreensão ajuizada por instituição financeira, para realização de pericial judicial, para averiguação do envolvimento em crime etc.).
            A norma prevê a necessidade de menção expressa das informações no contrato de venda e compra, sob pena de o empresário arcar com tributos, taxas, emolumentos e multas incidentes sobre o veículo até o momento da venda. Se o comprador vier a ser surpreendido, contará com a proteção legal.
            Em se tratando de veículo produto de furto, a lei reforça que caberá ao revendedor o dever de restituição do valor integral pago pelo comprador.
            A nova lei deixou claro que complementa as regras de proteção previstas no Código de Defesa do Consumidor (CDC).
            Na verdade, o nosso ordenamento jurídico já trazia suficiente proteção ao comprador. Isso porque é intuitivo, se nada em sentido contrário for convencionado, que o proprietário anterior do automóvel deva responder por débitos acumulados (tributos, multas, financiamento etc.). Mas a lei enfatizou ainda mais essa responsabilidade ao tratar especificamente da venda e compra de veículos. E consignou que é dele o dever de promover todas as pesquisas preventivas e documentar isso, sem o que poderá ter de pagar eventuais dívidas. O consumidor já não terá tanta dificuldade para provar o seu direito...
            A vantagem de se exigir contrato com todas as informações é que posteriormente o revendedor terá dificuldade para alegar, por ex., que a assunção de determinada dívida fez parte do negócio; que descontou o débito vencido do valor da venda... Esse acordo de abatimento de débitos vencidos no preço poderá até ser feito, mas o revendedor terá de documentá-lo.
            Nem sempre o revendedor toma a iniciativa de contratar para sonegar tributos, para “não aparecer”, propondo a transferência direta do proprietário anterior ao comprador. Mas essa prática é bastante arriscada para o comprador. Às vezes o comprador prefere o “desconto” no preço e não exige contrato. Mas agora a inexistência de contrato poderá ser interpretada contra o vendedor.
            É sempre conveniente que o contrato descreva detalhadamente o bem, discrimine o que está sendo entregue (preferencialmente com menção ao horário para que se defina a responsabilidade por multas), e aponte, inclusive, a quilometragem do automóvel. Não é demais ressaltar que o Superior Tribunal de Justiça (STJ) já decidiu que a venda de automóvel com a quilometragem adulterada caracteriza crime de alienação de mercadoria imprópria para o consumo previsto no artigo 7º, inciso IX, do Código de Defesa do Consumidor (“Habeas Corpus” 135.906). E não acolheu a alegação, feita pelo réu, de que apenas figurava como sócio da empresa. Decidiu que nos chamados crimes corporativos, ou seja, cometidos por meio de empresas, não é necessário que a denúncia indique, precisamente, quais as atividades e funções do denunciado dentro da sociedade, bastando a referência à conduta gerencial da pessoa jurídica. O hodômetro do carro tinha sido alterado e a quilometragem tinha sido reduzida em 30.000 km.
            Adote o hábito de colocar “tudo no papel”!
Adriano Rodrigo Ponce de Oliveira
Juiz de Direito / Professor no Unisalesiano
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(publicado no Diário de Penápolis de 2/4/2015 e abordado em entrevista na Rádio Regional Esperança de 30/3/2015)