O Código de Trânsito (Lei
9.503/1997) dedica especial atenção ao ciclista e também lhe impõe restrições.
No anexo I define bicicleta:
“veículo de propulsão humana, dotado de duas rodas, não sendo, para efeito
deste Código, similar à motocicleta, motoneta e ciclomotor”. Veja-se que se a
bicicleta for motorizada, não deve merecer o mesmo tratamento das tradicionais,
já que idealizado em virtude da maior fragilidade do veículo e,
consequentemente, da necessidade de maior proteção do seu condutor. Não poderá,
por ex., trafegar em ciclovias. Todavia, a questionável Resolução 465/2013 do
Contran equiparou a bicicleta dotada originalmente
de motor elétrico auxiliar às convencionais e permitiu a sua circulação
em ciclovias e ciclo faixas, atendidas algumas condições, dentre elas, a
potência nominal máxima de até 350 Watts e a existência de dispositivo que
garanta o funcionamento do motor somente quando o condutor pedalar (como apoio
à propulsão humana e não como força principal), sem acelerador, o que não se
costuma ver por aí...
A bicicleta é considerada veículo de
passageiros (art. 96).
O art. 105 relaciona equipamentos obrigatórios para
bicicletas: campainha; sinalização noturna dianteira, traseira, lateral e nos
pedais; espelho retrovisor do lado esquerdo. A intenção é propiciar maior
segurança e visibilidade para o ciclista e evitar acidentes. A Resolução
46/1998 do Contran também trata do tema. Mas há quem discorde e existe projeto
de lei para retirar campainha e retrovisor da lista.
Sobre a circulação de bicicletas, deve acontecer, quando
não houver ciclovia, ciclofaixa ou acostamento, ou quando não for possível a
sua utilização, nos bordos (nas margens) da pista de rolamento, no mesmo
sentido de circulação regulamentado para a via, com preferência sobre os
veículos automotores (art. 58). Não é permitido, como se vê, pedalar na
contramão. Mas quando a via tem sentido único, não se exige que o ciclista
fique do lado direito. O dispositivo fala em “bordos”, ou seja, usa o plural. Havendo
ciclofaixa na via, a autoridade de trânsito pode autorizar a circulação de
bicicletas no sentido contrário ao fluxo dos veículos automotores (de frente
para eles).
A circulação de bicicletas nos
passeios (calçadas ou partes de pistas separadas para o uso prioritário de
pedestres) pode ser objeto de autorização expressa da autoridade. Quando a
sinalização permissiva não existir (normalmente é o que acontece), essa
circulação é irregular e configura infração média prevista no artigo 255,
apenada com pena pecuniária e remoção da bicicleta, “mediante recibo para o
pagamento da multa”. Mesmo que a circulação seja permitida, se for feita de
forma agressiva, a infração estará configurada. Anote-se que o ciclista
desmontado empurrando a bicicleta equipara-se ao pedestre em direitos e deveres
(art. 68).
Ao conceituar “acostamento” o Código
deixou claro que uma das suas funções é favorecer a “circulação de pedestres e
bicicletas, quando não houver local apropriado para esse fim”. O art. 244
proíbe ciclos de transitarem em vias de trânsito rápido ou rodovias, salvo onde
houver acostamento ou faixas de rolamento próprias. Por isso, nada impede que
se pedale nos acostamentos das rodovias. Aliás, já tive a curiosidade de
conversar com policiais rodoviários sobre a questão e fui informado de que não
há orientação para repressão da prática.
Para o condutor de automotores há previsão de multa para
a infração de natureza média consistente em “deixar de guardar a distância
lateral de um 1,5 m ao passar ou ultrapassar bicicleta”. Não se aproximar,
portanto, é dever estampado no art. 201, muito embora nem sempre observado, às
vezes, por culpa do próprio ciclista. Se sobrevier acidente, essa norma será
considerada na avaliação da responsabilidade, juntamente com outros fatores (se
o motorista foi sido surpreendido por uma manobra inesperada etc.). O fato é
que o motorista deve sempre redobrar a atenção.
Os notórios benefícios do ciclismo para a saúde e a
intenção de oxigenar o trânsito têm despertado cada vez mais o interesse de
autoridades por fomentar a prática. Algumas enxergam nesse apoio uma importante
bandeira eleitoral. As alterações viárias, todavia, devem ser feitas com muito
critério. Não dá para improvisar colocando em risco a vida do outro. A
convivência entre automóveis e bicicletas sempre foi complicada e a mudança de
mentalidade deve ser feita gradativamente para que todos tenham segurança. O
aumento do número de automóveis tem intensificado o trânsito e exigido soluções
complexas e que demandam muito estudo e investimento. É melhor anunciar poucas
ciclovias seguras do que várias inseguras e/ou que impliquem sérios prejuízos
ao fluxo dos demais veículos. Tanto isso é verdade que várias iniciativas
públicas têm desaguado no Judiciário, especialmente nos grandes centros. De
qualquer forma, a ampliação do uso da bicicleta parece um caminho irreversível;
e que bom que tem sido assim...
Adriano
Rodrigo Ponce de Oliveira
Juiz de
Direito / Professor no Unisalesiano
Facebook
Adriano Ponce Jurídico
(publicado
na edição de abril de 2015 da Revista Comunica e na edição de 9/4/2015 do
Diário de Penápolis – abordado em entrevista à Rádio Regional Esperança aos
6/4/2015)