O Superior Tribunal de Justiça, ao analisar,
em agosto de 2015, o Recurso Especial 1.480.881-PI,
firmou posicionamento acerca de uma antiga discussão jurídica: sexo com menor
de 14 anos, se consentido, deve mesmo caracterizar estupro ou é necessário
avaliar cada caso? E se o agente está namorando a vítima há tempos? E se estão
noivos? E se já convivem maritalmente? E se a família aceita a relação? E se a
pessoa menor de 14 anos já tem experiência? E se naquela região a prática é
aceita pela comunidade? Nesses casos deve mesmo incidir sanção penal que varia
de 8 a 15 anos de reclusão?
A Terceira Seção do STJ
enfrentou a discussão em regime de recursos repetitivos para uniformizar, no
âmbito daquela Corte, a solução desse problema.
No entendimento dos
Ministros, para a caracterização do crime de estupro de vulnerável
previsto no art. 217-A, “caput”, do Código Penal, basta que o
agente tenha conjunção carnal ou pratique qualquer ato libidinoso com pessoa
menor de 14 anos. O consentimento da vítima, a sua experiência sexual anterior
ou a existência de relacionamento amoroso entre o agente e a vítima não afastam
a ocorrência do crime.
Suas Excelências levaram em consideração as
alterações legislativas introduzidas no Código Penal pela Lei Federal 12.015/2009.
Rechaçaram a tese de que a vulnerabilidade da vítima teria de ser aferida conforme
as circunstâncias. Ficou decidido que a nova redação do artigo 217-A proibiu,
de forma absoluta, conjunção carnal ou qualquer outro ato libidinoso com menor
de 14 anos, sendo vedado ao aplicador da lei qualquer flexibilização da sua
incidência para que não se esvazie a proteção constitucional destinada a tais
pessoas. Nem mesmo a demonstração, por parte da defesa do réu, de que a pessoa
ofendida tem conhecimento sexual ou é dada à prostituição, é capaz de favorecer
o agente. Os julgadores consideraram que a evolução social não pode justificar
a tolerância às práticas sexuais com menores de 14 anos, pois a legislação tem adotado
caminho inverso, ou seja, tem enrijecido a proteção. Enfatizaram que não
poderiam concordar que casos do gênero ficassem à mercê do subjetivismo do
juiz, “sob pena de ocorrência de possíveis danos relevantes ao bem jurídico
tutelado - o saudável crescimento físico, psíquico e emocional de crianças e
adolescentes”. Arremataram que “praticamente todos os países do mundo repudiam
o sexo entre um adulto e um adolescente - e, mais ainda, com uma criança - e
tipificam como crime a conduta de praticar atos libidinosos com pessoa ainda
incapaz de ter o seu consentimento reconhecido como válido”. Manifestaram
repugnância à aceitação do “padrão de comportamento tipicamente
patriarcal e sexista, amiúde observado em processos por crimes dessa natureza,
nos quais o julgamento recai inicialmente sobre a vítima da ação delitiva,
para, somente a partir daí, julgar-se o réu”.
Se na data do fato o agente ainda não tinha 18 anos, como sói acontecer,
diante da inimputabilidade, responderá pelo ato infracional em conformidade com
o disposto no Estatuto da Criança e do Adolescente.
O pronunciamento do STJ acabará influenciando das demais instâncias. As
razões que o fundamentaram são consistentes. O Tribunal tem a incumbência de
direcionar a interpretação das leis federais. A resposta penal para o estupro
de vulnerável é grave. É preciso que todos estejam atentos aos riscos.
Adriano Rodrigo Ponce de Oliveira
Juiz de Direito / Professor no Unisalesiano
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