Quem sou eu

Juiz de Direito desde 2007. Titular do Juizado Especial Cível de Lins(SP). Ex-Professor do Curso de Direito do Unisalesiano em Lins(SP). Ex-delegado de polícia. Motociclista, tatuado e corintiano do "bando de loucos".

3 de jan. de 2016

Sexo com menor de 14 anos, mesmo que consentido, é estupro


O Superior Tribunal de Justiça, ao analisar, em agosto de 2015, o Recurso Especial 1.480.881-PI, firmou posicionamento acerca de uma antiga discussão jurídica: sexo com menor de 14 anos, se consentido, deve mesmo caracterizar estupro ou é necessário avaliar cada caso? E se o agente está namorando a vítima há tempos? E se estão noivos? E se já convivem maritalmente? E se a família aceita a relação? E se a pessoa menor de 14 anos já tem experiência? E se naquela região a prática é aceita pela comunidade? Nesses casos deve mesmo incidir sanção penal que varia de 8 a 15 anos de reclusão?
A Terceira Seção do STJ enfrentou a discussão em regime de recursos repetitivos para uniformizar, no âmbito daquela Corte, a solução desse problema.
No entendimento dos Ministros, para a caracterização do crime de estupro de vulnerável previsto no art. 217-A, “caput”, do Código Penal, basta que o agente tenha conjunção carnal ou pratique qualquer ato libidinoso com pessoa menor de 14 anos. O consentimento da vítima, a sua experiência sexual anterior ou a existência de relacionamento amoroso entre o agente e a vítima não afastam a ocorrência do crime.
Suas Excelências levaram em consideração as alterações legislativas introduzidas no Código Penal pela Lei Federal 12.015/2009. Rechaçaram a tese de que a vulnerabilidade da vítima teria de ser aferida conforme as circunstâncias. Ficou decidido que a nova redação do artigo 217-A proibiu, de forma absoluta, conjunção carnal ou qualquer outro ato libidinoso com menor de 14 anos, sendo vedado ao aplicador da lei qualquer flexibilização da sua incidência para que não se esvazie a proteção constitucional destinada a tais pessoas. Nem mesmo a demonstração, por parte da defesa do réu, de que a pessoa ofendida tem conhecimento sexual ou é dada à prostituição, é capaz de favorecer o agente. Os julgadores consideraram que a evolução social não pode justificar a tolerância às práticas sexuais com menores de 14 anos, pois a legislação tem adotado caminho inverso, ou seja, tem enrijecido a proteção. Enfatizaram que não poderiam concordar que casos do gênero ficassem à mercê do subjetivismo do juiz, “sob pena de ocorrência de possíveis danos relevantes ao bem jurídico tutelado - o saudável crescimento físico, psíquico e emocional de crianças e adolescentes”. Arremataram que “praticamente todos os países do mundo repudiam o sexo entre um adulto e um adolescente - e, mais ainda, com uma criança - e tipificam como crime a conduta de praticar atos libidinosos com pessoa ainda incapaz de ter o seu consentimento reconhecido como válido”. Manifestaram repugnância à aceitação do “padrão de comportamento tipicamente patriarcal e sexista, amiúde observado em processos por crimes dessa natureza, nos quais o julgamento recai inicialmente sobre a vítima da ação delitiva, para, somente a partir daí, julgar-se o réu”.
Se na data do fato o agente ainda não tinha 18 anos, como sói acontecer, diante da inimputabilidade, responderá pelo ato infracional em conformidade com o disposto no Estatuto da Criança e do Adolescente.
O pronunciamento do STJ acabará influenciando das demais instâncias. As razões que o fundamentaram são consistentes. O Tribunal tem a incumbência de direcionar a interpretação das leis federais. A resposta penal para o estupro de vulnerável é grave. É preciso que todos estejam atentos aos riscos.
Adriano Rodrigo Ponce de Oliveira
Juiz de Direito / Professor no Unisalesiano
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(publicado no Diário de Penápolis de 5/11/2015 e no Correio de Lins de 7/11/2015)