Quem sou eu

Juiz de Direito desde 2007. Titular do Juizado Especial Cível de Lins(SP). Ex-Professor do Curso de Direito do Unisalesiano em Lins(SP). Ex-delegado de polícia. Motociclista, tatuado e corintiano do "bando de loucos".

3 de jan. de 2016

Tipificação da corrupção no Código Penal

Tramita no Senado proposta para edição de um novo Código Penal (Projeto de Lei do Senado 236). Ao que consta, está na Comissão de Constituição e Justiça.
A tendência que o ato de exigir, solicitar, aceitar ou receber vantagem indevida, como representante de empresa ou instituição privada, para favorecer a si ou a terceiros, direta ou indiretamente, ou aceitar promessa de vantagem indevida para favorecer a si ou a terceiro, a fim de realizar ou omitir ato inerente a suas atribuições, passe a caracterizar infração penal.
Muito se fala da corrupção no setor público, mas ela está bastante presente nas empresas, especialmente nos setores que movimentam recursos (compras, financeiro). Penso que a criação desse tipo penal é mesmo necessária. Muitas vezes a vantagem exigida pelo comprador acaba sendo embutida no preço pelo fornecedor, o que repercute nas finanças da empresa e na economia como um todo. Devemos acompanhar atentamente a votação dessa proposta que tanto interessa à sociedade.
Enquanto isso, é bom lembrar o que o atual Código Penal (Decreto-Lei 2.848/1940) dispõe sobre a corrupção no título dos crimes contra a administração pública.
A corrupção passiva é a praticada pelo funcionário público e a corrupção ativa é a cometida por quem age como particular.
Normalmente todos os que concorrem para a mesma prática criminosa incidem no mesmo artigo de lei, mas o Código Penal decidiu tratar das condutas separadamente.
Eis a previsão sobre corrupção passiva:
Art. 317 - Solicitar ou receber, para si ou para outrem, direta ou indiretamente, ainda que fora da função ou antes de assumi-la, mas em razão dela, vantagem indevida, ou aceitar promessa de tal vantagem:
Pena – reclusão, de 2 (dois) a 12 (doze) anos, e multa.
§ 1º - A pena é aumentada de um terço, se, em conseqüência da vantagem ou promessa, o funcionário retarda ou deixa de praticar qualquer ato de ofício ou o pratica infringindo dever funcional.
§ 2º - Se o funcionário pratica, deixa de praticar ou retarda ato de ofício, com infração de dever funcional, cedendo a pedido ou influência de outrem:
Pena - detenção, de três meses a um ano, ou multa.
A solicitação da vantagem pode acontecer de forma explícita ou implícita (por gesto, insinuação, ironia etc.). Trata-se de crime formal que se configura com a mera solicitação ou recebimento da vantagem indevida; ou mesmo com a aceitação da promessa dela.
Ainda que o ato a ser praticado pelo funcionário seja legal, o crime se configurará. Já se entendeu que a vantagem revertida para a administração afasta o crime, mas é preciso analisar cada caso. Predomina o entendimento de que a vantagem não precisa ser patrimonial.
Tratemos da previsão dirigida ao particular:
Corrupção ativa
Art. 333 - Oferecer ou prometer vantagem indevida a funcionário público, para determiná-lo a praticar, omitir ou retardar ato de ofício:
Pena – reclusão, de 2 (dois) a 12 (doze) anos, e multa.
Parágrafo único - A pena é aumentada de um terço, se, em razão da vantagem ou promessa, o funcionário retarda ou omite ato de ofício, ou o pratica infringindo dever funcional.
O oferecimento, da mesma forma, pode ser feito por palavras, gestos e escritos. A postura de quem oferece deverá ser minuciosamente analisada para que a sua verdadeira intenção seja extraída. Pedir ao funcionário para “dar um jeitinho” geralmente não consuma a corrupção ativa por não envolver oferta de vantagem. Somente a oferta ou promessa idônea geram responsabilização penal.  O crime se consuma quando quem oferece a vantagem tem a intenção específica de fazer com que o funcionário pratique, retarde a prática ou omita “ato de ofício”, ou seja, algo que faça parte das atribuições dele. Basta que o funcionário tome conhecimento, não se exigindo que haja da maneira proposta e nem que se sinta ofendido. O particular que simplesmente atende à solicitação do funcionário corrupto, mantendo, portanto, postura passiva, não pratica o delito do art. 333. De qualquer forma, alimenta o esquema criminoso. A mera gratificação pelo bom atendimento que sucede o ato administrativo, desde que de pequeno valor, porque, em tese, não compromete o funcionamento do serviço público e não envolve má-fé, geralmente não configura o delito.
Adriano Rodrigo Ponce de Oliveira
Juiz de Direito / Professor no Unisalesiano
Facebook Adriano Ponce Jurídico
(publicado no Diário de Penápolis de 17/12/2015)