Todo profissional deve se preocupar com
a privacidade das pessoas que atende e/ou com as quais se relaciona. E deve
instruir suficientemente seus colaboradores acerca dessa necessidade.
Certa vez eu presenciei um servidor do
Cartório Eleitoral perguntando, à distância, a uma jovem de 16 anos que
solicitava a emissão do título, qual era o telefone dela. Na intenção de
alimentar o banco de dados ele nem se atentou para o fato de que havia rapazes
no mesmo ambiente e de que algum deles poderia fazer mau uso da informação.
Sensível ao risco, orientei meu colega de trabalho para que passasse a
solicitar dados pessoais com a máxima discrição.
Imediatamente eu me lembrei da
insatisfação que às vezes sintoquando visito consultórios médicos e algumas
secretárias insistem em perguntar tudo em voz alta, em vez de solicitarem que
eu me aproxime do balcão ou preencha uma ficha. Ninguém precisa saber se fiz
determinado exame...
Devemos ter mente que nem todos se
sentem à vontade para revelar telefone, profissão, endereço, estado civil e outras
informações pessoais diante de terceiros. Houve uma ocasião em que determinada
atendente implicou comigo porque eu disse que não tinha telefone celular. Ela
suspeitou que eu não queria fornecê-lo, o que realmente era minha vontade, por
entender que a informação não era necessária.
Há casos em que desprezar a privacidade
provoca risco para a segurança, o que acontece, por ex., quando aquele monitor
do caixa do supermercado mostra, para todos os que estão nas imediações, o
valor da compra, a forma de pagamento e principalmente o troco que foi
fornecido ao cliente, expondo-o à ação de ladrões e golpistas.
Às vezes, revelar a profissão de alguém
pode lhe trazer riscos ou aborrecimentos e por isso não convém, publicamente,
dar a entender que a pessoa com quem a gente se encontra é policial, agente
penitenciário, promotor ou juiz. A outra pessoa pode não ficar tão à vontade ou
pode até mesmo ter de deixar o local.
A situação fica ainda mais delicada quando
as informações dizem respeito a questões mais íntimas. O cirurgião plástico,
por ex., na ânsia de convencer alguém a fazer determinado procedimento
estético, não tem o direito de revelar que fulana já se submeteu a ele. O
arquiteto não deveria exibir fotografias de áreas privativas das casas de
antigos para novos clientes ou pelo menos não deveria revelar os nomes dos
primeiros, limitando-se a discutir idéias. O servidor público, até mesmo em
razão das limitações disciplinares e legais, não deveria comentar fatos que
chegam ao seu conhecimento em razão das funções.
Na mesma esteira, profissionais
liberais e empregadores em geral deveriam monitorar permanentemente seus
subordinados para que situações de indiscrição fossem evitadas. Profissionais
que visitam residências, como entregadores de água e vidraceiros, por ex., não
deveriam fazer perguntas do tipo “quanto custa essa moto?” ou “onde você
comprou isso?”. A indiscrição pode provocar a perda do cliente.
Mesmo nas nossas relações sociais,
temos de tomar cuidado para não formularmos perguntas indiscretas para aquela
pessoa que encontramos em ambientes públicos (como filas de banco), onde não
devemos tratar, por ex., na presença de terceiros, de doenças, dívidas e infortúnios
familiares e amorosos. E não devemos divulgar telefones de terceiros sem
autorização expressa ou sem que o contexto indique que a pessoa gostaria de ser
contatada.
Essa preservação da privacidade exige,
inclusive, que aquele que toma conhecimento da informação se abstenha de
comentá-la até mesmo em casa, uma vez que não raramente ela se dissemina não
por má-fé, mas por descuido de algum familiar do profissional. Não é difícil,
ainda, que atritos familiares impliquem na divulgação voluntária de informações
sigilosas como forma de retaliação. Quem não se lembra de rebuliços que esposas
de políticos já causaram?
Muitas vezes a gente não se dá conta de
que expomos os outros e de que ao mesmo tempo em muitos gostam de “aparecer”
(principalmente por meio de redes sociais), outros ainda preferem a
tranquilidade e o anonimato (que vale muito, principalmente, para quem já não é
tão anônimo assim)...
Ainda que não se preocupe tanto com a
sua, que tal refletir sobre como tem lidado com a privacidade do outro?
Adriano Rodrigo Ponce de Oliveira
Juiz de Direito da 2ª Vara de Penápolis(SP)
Prof. do Curso de Direito
do Unisalesiano
(publicado na Revista Comunica de jun/2013)
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