Quem sou eu

Juiz de Direito desde 2007. Titular do Juizado Especial Cível de Lins(SP). Ex-Professor do Curso de Direito do Unisalesiano em Lins(SP). Ex-delegado de polícia. Motociclista, tatuado e corintiano do "bando de loucos".

21 de fev. de 2015

Busca pessoal


O fato de um indivíduo ter tentado se esquivar de busca pessoal anunciada por policiais militares aos frequentadores de um bar há alguns dias inspirou-me a tratar do assunto.
O art. 240, § 2º, do vigente Código de Processo Penal, autoriza a busca pessoal, popularmente conhecida como “revista”, quando houver fundada suspeita de que alguém oculte consigo arma proibida ou munições; objetos achados ou obtidos por meios criminosos; instrumentos de falsificação ou de contrafação e objetos falsificados ou contrafeitos; instrumentos utilizados para a prática de crime ou destinados a fim delituoso; objetos necessários à prova de infração ou à defesa do réu; cartas cujo conteúdo possa ser útil à elucidação do fato ou qualquer outro elemento de convicção.
A busca pessoal, reza o art. 244 do mesmo Código, independerá de mandado no caso de prisão ou quando houver fundada suspeita de que a pessoa esteja na posse de arma proibida ou de objetos ou papéis que constituam corpo de delito.
Muitos questionam a alegada “subjetividade” de que, no seu entender, se servem determinados policiais para a realização da busca pessoal.
É evidente que “encostar no paredão” não é das experiências mais agradáveis e as críticas decorrentes de busca improdutiva sob o ponto de vista da apreensão de objetos relacionados a crimes são inevitáveis. Particularmente considero que a “produtividade” da busca pessoal não está circunscrita somente ao êxito de se encontrar indício de infração penal. Os efeitos da diligência vão além: pelo simples fato de saber que pode ser revistado a qualquer momento se despertar fundada suspeita, o cidadão já evita levar consigo arma ou qualquer outro objeto proibido. A busca pessoal, portanto, tem muito mais finalidade preventiva do que propriamente repressiva. E se o procedimento para busca fosse mais “burocrático”? Certamente a bandidagem se aproveitaria, como já se aproveita para guardar droga e objetos roubados dentro de casa, diante dos “empecilhos” legais que existem para que a busca domiciliar possa ocorrer...
Não se pode negar que é um poder delegado pelo Estado à Polícia que deve ser cautelosamente exercido para não provocar constrangimentos necessários.
Ocorre que, nos dias atuais, não se pode mais individualizar suspeitos com a facilidade de antigamente. Pessoas de bem, de boa aparência, irretocavelmente trajadas e mesmo de excelente nível social cada vez mais sucumbem às drogas na condição de usuárias ou até mesmo de traficantes (posto geralmente assumido para sustentar o vício). Não raramente são abordadas portando ilegalmente arma de fogo, conduta muitas vezes incentivada pelo aumento da criminalidade. Diante de tal constatação, as buscas pessoais, notadamente nos bares e locais malfreqüentados, principalmente no período noturno, têm se intensificado. Defronte às escolas há necessidade de que se ocorram até mesmo durante o dia, para afastar indivíduos desocupados que promovem o tráfico de drogas e até mesmo a extorsão de alunos.
A situação atual, portanto, exige muita cautela por parte da Polícia, e paciência redobrada por parte dos cidadãos de bem que eventualmente se vêem obrigados à busca pessoal. O exercício do direito de ir e vir e a proteção à tranqüilidade e, por que não, à própria dignidade das pessoas devem sucumbir, dependendo da situação, ao interesse da coletividade em preservar a ordem pública.
A legislação deixa tão clara essa intenção que permite, inclusive, que homens revistem mulheres em situações excepcionais em que não haja possibilidade de se evitar tal contato sem que haja retardamento ou prejuízo da diligência (art. 249 do CPP). Tal possibilidade existe desde 1942, época em que “suspeito era suspeito, cidadão era cidadão”. Hoje ambos se misturam como cocaína e bicarbonato no meio da multidão...
Com coerência e bom senso é possível que se evitem confrontos desnecessários entre policiais e a coletividade.
A recusa imotivada à busca pessoal, frise-se, poderá até configurar o delito de desobediência, previsto no art. 330 do Código Penal.
Havendo tratamento respeitoso por parte do policial, recomenda-se que as pessoas se submetam à busca que, na maioria dos casos, é feita em menos de um minuto. Eventuais reclamações poderão ser feitas posteriormente junto aos superiores do policial ou outros órgãos competentes. O que é preciso salientar é que nem sempre o cidadão comum compreenderá o motivo, ou seja, nem sempre terá conhecimento dos fatos que estão acontecendo ao seu redor; de que está em local duvidoso; de que alguém com características semelhantes as suas foi apontado como autor de crime etc. Podemos assegurar que na maioria das vezes a Polícia objetiva cumprir seu dever, sendo raríssimos os casos em que o policial se desvia dele para incomodar imotivadamente algum desafeto (caso em que poderá ser responsabilizado, evidentemente).
Tenham certeza de uma coisa: sem as buscas pessoais ou mesmo sem a possibilidade delas ocorrerem de forma imediata, a coletividade certamente sofreria as conseqüências da crescente audácia dos inimigos da sociedade... Compreendamos que se trata de um “mal necessário”!
Adriano Rodrigo Ponce de Oliveira
Delegado de Polícia, Diretor da Cadeia Pública e da 37ª Ciretran de Getulina(SP)
(publicado no Getulina Jornal de 9/11/2003)