Quem sou eu

Juiz de Direito desde 2007. Titular do Juizado Especial Cível de Lins(SP). Ex-Professor do Curso de Direito do Unisalesiano em Lins(SP). Ex-delegado de polícia. Motociclista, tatuado e corintiano do "bando de loucos".

15 de fev. de 2015

Gratuidade da prestação jurisdicional

A prestação jurisdicional é um serviço público como qualquer outro. Carece de remuneração porque é serviço de interesse específico de quem precisa demandar ou buscar a intermediação do Judiciário quando ela acaba sendo obrigatória. Está à disposição de todos, mas o seu custo deve ser repassado, em parte, apenas aos efetivos usuários.
Sem recursos, o poder público não tem como ampliar e modernizar a sua atuação. Não consegue acompanhar a crescente procura. Arrecada tributos, mas tem cada vez mais a fazer... E se há desvios, devemos lutar contra eles...
Tenho percebido visível alteração nos entendimentos dos tribunais sobre o benefício que costumamos denominar de "gratuidade processual".
A Lei Federal 1.060/1950 contemplou o benefício e previu que deveria ser concedido a quem se declarasse sem condições de arcar com as despesas do processo. Por muito tempo preponderou o entendimento de que o juiz não deveria exigir comprovação da alegada pobreza, mas conceder a gratuidade e aguardar eventual impugnação da parte adversária, ou seja, se tornar refém de um incidente processual que às vezes não surgia até pelo descuido.
O inconveniente é que às vezes dois ricos demandavam sem pagar despesas processuais, pois o autor da ação se declarava pobre e o adversário não impugnava a gratuidade, mas, ao contrário, mesmo abastado, também reclamava o mesmo favor legal. Com esse "acordo de cavalheiros", os dois reduziam seus riscos e se acertavam "por fora" quando a causa tinha desfecho e os honorários sucumbenciais eram impostos.
Nesses casos, o erário tinha de se virar para recuperar o prejuízo, o que tardava ou mesmo não acontecia.
Ainda há quem conceda gratuidade diante de mera solicitação, mas o entendimento contrário felizmente tem ganhado muita força.
O inciso LXXIV do artigo 5.o da Constituição Federal prevê que a assistência jurídica gratuita é direito dos que "comprovarem" a necessidade. A Lei 1.060 deve ser interpretada em consonância com a norma constitucional. A gratuidade tem por objetivo garantir o acesso à Justiça àquele que de fato não pode custear a taxa judiciária e outros valores. Negar o benefício a quem não faz prova da hipossuficiência não significa obstaculizar a o acesso ao Judiciário, mas dar efetividade à vontade do constituinte, preservar a arrecadação, evitar que todos paguem por serviço prestado à alguns e reduzir ajuizamentos levianos.
Quanto maiores forem os riscos, teoricamente, mais as pessoas analisarão alternativas ao processo, o que será bom para quem não tiver escolha e precisar litigar, já que receberá mais atenção e a capacidade operacional do serviço será ampliada.
É isso que pensa o juiz que, assim como eu, adota o entendimento mais rigoroso. A sua visão não se restringe apenas ao caso que está sendo examinando. Nem passa pela sua cabeça apenas causar embaraço. Muito menos intenta reduzir o número de processos por meio de um mero capricho processual...
Adriano Rodrigo Ponce de Oliveira
Juiz de Direito / Professor no Unisalesiano
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(publicado no Diário de Penápolis de 18/12/2014 e no Correio de Lins de 17/12/2014)