No caso do homicídio, age com dolo direto aquele que
busca deliberadamente produzir a morte, por exemplo, ao disparar contra o seu
desafeto. O homicídio doloso, na sua forma mais simples, é punido com reclusão
de 6 a 20 anos. Dolo, em linhas gerais, significa “vontade”.
O homicídio culposo é praticado por aquele que causa
morte sem intenção, mas em virtude de ter sido imprudente (agiu de maneira
descuidada), negligente (deixou de se acautelar) ou imperito (faltou habilidade
no exercício de uma profissão). Para o homicídio culposo o Código Penal prevê
detenção de 1 a 3 anos e o Código de Trânsito estabelece detenção de 2 a 4
anos.
As sanções são bastante diferentes porque, obviamente,
desejar a morte não é a mesma coisa do que causá-la por descuido.
Em alguns casos, é bastante complicado diferenciar o dolo
eventual da culpa consciente. Quando o sujeito pratica uma conduta arriscada,
não deseja morte, mas também não se importa com a possibilidade de causá-la,
age com dolo eventual. Isso acontece, por exemplo, quando acelera o carro,
passa pelo semáforo vermelho, invade movimentada avenida e causa colisão. Nesse
caso, o condutor aceita o risco. O mesmo ocorre com o motorista que pratica
racha onde há concentração de pessoas. O dolo eventual tem a mesma consequência
jurídica do dolo direto. Em resumo, atirar no inimigo ou invadir a avenida
aceitando a possibilidade de causar acidente fatal configuram homicídios
dolosos apenados, em tese, da mesma maneira. No segundo caso, o instrumento do
crime não é a arma de fogo, mas o veículo.
Pode ser que o sujeito preveja o risco, mas confie, sinceramente, que não causará dano. O
atirador de facas do circo treina bastante e se sente habilitado a desempenhar
aquele papel. Se tiver tomado todas as cautelas e, mesmo assim, tiver errado um
arremesso e causado a morte da assistente, será responsabilizado por homicídio
culposo.
O fato de o condutor causador de acidente estar
embriagado, juridicamente, não pode implicar, de forma automática, na sua
responsabilização por homicídio doloso. O Supremo Tribunal Federal, ao julgar o
“Habeas Corpus” 107.801, decidiu, em 2011, que “a embriaguez alcoólica que
conduz à responsabilização a título doloso é apenas a preordenada,
comprovando-se que o agente se embebedou para praticar o ilícito ou assumir o
risco de produzi-lo”. De outro lado, se a “embriaguez é voluntária e completa e
o agente previu e podia prever que, em tal estado, poderia vir a cometer crime,
a pena é aplicável a título de culpa”. O Superior Tribunal de Justiça também já
confirmou desclassificação de homicídio doloso para culposo ao decidir: “a
embriaguez, por si só, sem outros elementos do caso concreto, não pode induzir
à presunção, pura e simples, de que houve intenção de matar, notadamente se,
como na espécie, o acórdão concluiu que, na dúvida, submete-se o paciente ao
Júri, quando, em realidade, apresenta-se de maior segurança a aferição técnica
da prova pelo magistrado da tênue linha que separa a culpa consciente do dolo eventual”
(HC 328.426/SP, 2015).
A combinação de embriaguez e excesso de velocidade sugere
insensibilidade do condutor (STJ, AgRg no AREsp 739.762/PR, 2016), mas detalhes
de cada caso é que dirão se ele pouco se importou com a possibilidade de matar
alguém no trânsito.
Se houver dúvida fundada sobre a aceitação ou não do
resultado previsível, o juiz deverá encaminhar o caso para o Tribunal do Júri.
Caberá os jurados analisarem aquilo que tem aparência de crime doloso contra a
vida. Se as provas demonstrarem o contrário, decidirão por crime meramente
culposo. Todavia, se não houver indícios mínimos de dolo, o próprio magistrado
se encarregará do julgamento.
A aplicação da lei penal depende de prova contundente da
responsabilidade, que não pode ser firmada com base em presunções. As
autoridades devem solucionar os casos com bastante técnica e sem se preocuparem
com a opinião popular para não cometerem injustiças. Se a resposta penal não é
apropriada, devemos incentivar alterações legais.
Adriano Rodrigo Ponce de Oliveira
Juiz de Direito
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(publicado na edição de 10/9/2016 do Diário de Penápolis)