Quem sou eu

Juiz de Direito desde 2007. Titular do Juizado Especial Cível de Lins(SP). Ex-Professor do Curso de Direito do Unisalesiano em Lins(SP). Ex-delegado de polícia. Motociclista, tatuado e corintiano do "bando de loucos".

31 de ago. de 2016

O uso das algemas e a Súmula Vinculante 11 do STF

As algemas eram usadas, na antiguidade, por volta do século XVI, para castigar ou humilhar os infratores. Hoje, a finalidade é garantir a segurança pública.
O julgamento do HC nº 91.952 pelo STF originou a Súmula Vinculante 11, que disciplinou o uso das algemas quando houver fundado receio de fuga, resistência, ou perigo à integridade física de terceiros ou do próprio detido. Vejamos: “Só é lícito o uso de algemas em casos de resistência e de fundado receio de fuga ou de perigo à integridade física própria ou alheia, por parte do preso ou de terceiros, justificada a excepcionalidade por escrito, sob pena de responsabilidade disciplinar, civil e penal do agente ou da autoridade e de nulidade da prisão ou do ato processual a que se refere, sem prejuízo da responsabilidade civil do Estado”.
A Lei de Execuções Penais determinou, em seu artigo 199, que a regulamentação do uso das algemas seja feita por decreto federal. Surgiram diversos projetos, mas nenhum prosperou. Segundo o Código de Processo Penal, o uso deve ser excepcional. O Estatuto da Criança e do Adolescente não prevê e nem proíbe o uso algemas, mas há controvérsias devido à ausência de previsão. De um lado, há quem sustente proibição, pois se o Estatuto veda o transporte de adolescente em compartimento fechado de viatura policial, em tese, não admite o uso das algemas, já que em ambas as situações se resguarda a pessoa do investigado. De outro lado, muitos defendem que o emprego das algemas em adolescentes é permitido, desde que justificado pela periculosidade, diante da ausência de proibição legal específica.
O Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, relator do Habeas Corpus 140982-RJ no STJ, refutou nulidade da audiência de apresentação, invocada com base no uso das algemas em um adolescente. Ele estava sendo investigado pela pratica de ato infracional equiparado a homicídio qualificado que, segundo consta, tinha relação com o tráfico de drogas. Sua Excelência entendeu que não houve violação ao disposto na Súmula. O Tribunal Paulista, nos autos da Apelação 0007511-10.2013.8.26.0482, aos 27/7/2016, rejeitou tese de nulidade, tendo a relatora Des. Ivana David ponderado: “Com efeito, não é nula a audiência em razão da manutenção das algemas durante a realização do ato, quando a medida está concretamente justificada, diante da periculosidade do réu e segurança dos cidadãos que transitam pelo Fórum de Presidente Prudente, isto porque para se dirigir até a sala de audiências o recorrente por corredores sempre repletos de pessoas”.
A Súmula Vinculante 11 visa a proteger a honra, a imagem e a intimidade do acusado enquanto a sua culpa não é reconhecida. No plenário do Tribunal do Júri, há quem diga que as algemas podem gerar impressão negativa do réu e influenciar os jurados. O Código de Processo Penal determina: “Art. 474, § 3º Não se permitirá o uso de algemas no acusado durante o período em que permanecer no plenário do júri, salvo se absolutamente necessário à ordem dos trabalhos, à segurança das testemunhas ou à garantia da integridade física dos presentes”.
Recentemente, o ministro Luiz Edson Fachin, nos autos da Reclamação 22.557 – STF, anulou audiência de instrução e julgamento pelo fato de o réu ter sido mantido algemado durante os atos processuais sem a fundamentação adequada, o que contrariou a Súmula Vinculante 11. A defesa do réu, que era acusado de tráfico de drogas, havia requerido ao juiz da Vara Criminal de São Gonçalo que as algemas fossem retiradas, mas o pedido havia sido negado.
O uso injustificado poderá gerar responsabilização do agente e nulidade da prisão. Se ele tiver tido por objetivo causar dor, pavor ou sofrimento, com o fito de obter informação, declaração ou confissão, poderá até responder por tortura.
A edição da súmula era desnecessária. Há quem critique o surgimento dela depois da prisão de uma pessoa influente (banqueiro Daniel Dantas). Agentes públicos não conseguem cumpri-la sem colocar em risco à sua integridade física. É impossível prever o que se passa na cabeça de um ser humano que almeja a liberdade.
A Suprema Corte dos Estados Unidos adota rol ampliado para o emprego das algemas e prestigia a análise subjetiva do estado de comportamento, dos antecedentes e da periculosidade, o que contribui para a redução de riscos para o agente policial e terceiros.
A exigência da fundamentação, de qualquer forma, deveria continuar, a fim de se evitarem arbitrariedades.
Carlos Alexandre de Souza
Graduando em Direito pelo Unisalesiano – Lins(SP)
(supervisão de Adriano Rodrigo Ponce de Oliveira – Juiz de Direito)

(publicado na edição de 18/8/2016 do Diário de Penápolis)