Boa parte dos pedidos de reparação
de danos decorrentes de acidentes de trânsito desemboca no Juizado Especial.
Muitas vezes os pedidos
indenizatórios não são instruídos com suficientes elementos de convicção por conta
de vacilos das partes.
É sempre recomendável documentar o
acidente por todos os meios disponíveis, principalmente por fotografias que
demonstrem, de vários ângulos e distâncias, as posições dos veículos, os danos,
a sinalização, os vestígios no pavimento, marcas de frenagens e outras
informações relevantes.
Não se deve abrir mão do registro da
ocorrência. Economizar tempo no dia poderá gerar muitos aborrecimentos
posteriormente. Pode ser que o acordo firmado na hora não seja cumprido.
Às vezes uma das partes implora para
que a polícia não seja acionada, por exemplo, porque não tem habilitação ou ela
está vencida, ou porque o veículo está com o licenciamento atrasado. É
importante ressaltar que a falta de habilitação e outras infrações
administrativas normalmente não geram presunção de culpa, a não ser que tenha
havido interferência na forma de condução do automóvel. Em alguns casos, a
outra parte concorda em não acionar a polícia porque se solidariza. Noutros
casos, imagina que ao dispensar a ocorrência, será indenizada mais rapidamente,
diante da colaboração com aquele que no momento assume a culpa pelo evento, e
pelo fato de o culpado acabar não tendo de pagar multas, diárias de pátio etc.
Cada pessoa tem de arcar com as suas escolhas. A recomendação, nesse caso, é a
de que, mesmo assim, toda a conversa e, em especial, o compromisso de
indenização, sejam registrados. Isso pode ser feito por meio do telefone
celular que disponha de aplicativo de gravação de áudio e/ou de vídeo. Ora, se
a pessoa se dispõe a pagar, então provavelmente não recusará a gravação da sua
fala. A recusa de confessar a culpa diante do microfone do aparelho será
indicativa da falta de compromisso. A gravação da conversa por um dos
interlocutores normalmente não é vista como invasão de privacidade pelos
Tribunais.
É conveniente que o envolvido em
acidente se atente para a existência de câmeras de segurança nas imediações e
peça ao proprietário os arquivos das imagens. Nos casos de acidentes não
presenciados por testemunhas ou mesmo naqueles casos em que a parte tem
dificuldade para promover oitivas de testemunhas (quando o paradeiro delas se
torna desconhecido; quando se recusam a colaborar etc.), as filmagens poderão
favorecer a intervenção do Judiciário.
Quando
o acidente gera lesão, cabe à polícia apurar a ocorrência ou não de crime
previsto no Código de Trânsito. Acontece de os veículos serem reposicionados
pelos próprios envolvidos porque a preservação do local poderia importar em
riscos para outros motoristas. São constantes os acidentes de trânsito com
vítimas e boa parte motiva ações judiciais de natureza cível (indenizatórias) e
criminal (apurações de crimes). É preciso
que a polícia judiciária reveja a praxe de dispensar exame do local sob o
argumento de que houve remoções dos veículos envolvidos. A mim me parece
que a justificativa não tem amparo legal. Ao contrário, o art. 6º do Código de
Processo Penal prevê que a autoridade policial deverá “colher todas as provas
que servirem para o esclarecimento do fato e suas circunstâncias” (inciso III).
Por meio da vistoria do local, mesmo que os veículos tenham sido retirados,
sempre é possível colher informações importantíssimas para as soluções de
demandas relacionadas. Ainda que a pessoa encarregada da vistoria venha a
alegar que não tem como formar convicção, ou seja, ainda que o laudo seja
inconclusivo, os elementos colhidos serão considerados pelo juiz, que não
poderá se furtar de decidir. Se, por ex., a discussão tiver a ver com a invasão
ou não da faixa de circulação oposta, vestígios no solo poderão favorecer a
determinação da sede da colisão. Portanto, é conveniente insistir na vistoria
do local e pedir ao policial que consigne na ocorrência que o pedido foi feito
e, no caso de negativa, dos motivos.
Aquele que se entende prejudicado
deve sempre se acautelar e se lembrar que poderá ter de convencer o juiz
daquilo que, dentro dele, pode já ser uma certeza, mas que será analisado em
conjunto com a versão do adversário e de todas as demais provas em Direito
admitidas.
Adriano Rodrigo Ponce de Oliveira
Juiz de Direito / Professor no Unisalesiano
Facebook Adriano Ponce Jurídico
www.direitoilustrado.blogspot.com.br
(publicado no Diário de Penápolis de 17/9/2015; abordado em entrevista concedida à Rádio Regional Esperança aos 14/9/2015)