Quem sou eu

Juiz de Direito desde 2007. Titular do Juizado Especial Cível de Lins(SP). Ex-Professor do Curso de Direito do Unisalesiano em Lins(SP). Ex-delegado de polícia. Motociclista, tatuado e corintiano do "bando de loucos".

2 de out. de 2015

Buraco na via pública como fundamento de indenização


            Como têm sido relativamente comuns as reclamações de prejuízos em razão de buracos e outras imperfeições nas vias e passeios públicos, resolvi verificar como o egrégio Tribunal de Justiça tem solucionado recursos em ações indenizatórias.
            Via de regra, a justiça tem reconhecido a responsabilidade objetiva do poder público pela má-conservação e/ou ausência de fiscalização e/ou de sinalização de irregularidades no pavimento: “é do Município o dever de conservar as vias públicas em bom estado a fim de proporcionar segurança no trânsito e evitar a ocorrência de acidentes que exponham a risco a vida e o patrimônio das pessoas (CF, artigos 30, VIII, e 182). O artigo 37, § 6º, da Constituição Federal dispõe que a responsabilidade dos entes públicos é objetiva pelos danos que seus agentes, nessa condição causarem a terceiros, por ação ou omissão, em consonância com o que vem sendo afirmado pela doutrina e pela jurisprudência” (Apelação 0020819-22.2012.8.26.0071).
            Em muitos casos a responsabilização abrange os danos materiais (como os prejuízos sofridos com a reparação do veículo e com tratamento médico); danos morais e aquilo que o trabalhador deixou de ganhar por ter ficado afastado das suas atividades, desde que, evidentemente, haja demonstração efetiva do que for alegado. Nos autos da Apelação 0001429-09.2011.8.26.0069 ficou decidido: “Dano moral configurado. É inequívoco o sofrimento que experimentou o autor em virtude do incidente, tendo vivenciado incômodos, dores e ferimentos. Estes, associados ao tempo despendido com o tratamento ensejaram, por certo, a modificação da rotina habitual do demandante, por prazo razoável, a justificar a fixação de danos morais. Provado o padecimento físico e psicológico imputados ao requerente, cabe a condenação da requerida ao pagamento de indenização por dano moral, o qual deverá ser arbitrado em obediência aos princípios da moderação e razoabilidade, sendo capaz de compensar a dor do lesado sem causar seu enriquecimento ilícito, e ter conteúdo didático, a fim de evitar a reincidência da conduta lesiva, sem, contudo, proporcionar enriquecimento sem causa à vítima do dano moral”. Ao julgar a Apelação 0121601-33.2008.8.26.0053, o Tribunal reconheceu “lucros cessantes” com base em “declaração do empregador de que a autora trabalhava como cozinheira e recebia R$ 120,00 por semana”.
            É evidente que o direito do acidentado (daquele que perdeu o controle do carro ou sofreu queda da motocicleta ou da bicicleta) somente pode ser reconhecido se ele produzir provas indicativas da existência da imperfeição no pavimento, da relação entre a irregularidade e o acidente (nexo causal) e de que trafegava regularmente e por isso não deu causa, exclusivamente, ao evento. Há precedente, por exemplo, no sentido de que o rebaixamento do carro e a instalação de pneus muito diferentes dos originais, em determinado acidente, foram determinantes, tendo sido reconhecida a culpa concorrente (Apelação 0000837-67.2010.8.26.0111), o que significa, na prática, a redução da indenização em razão da divisão da responsabilidade. A análise de detalhes do caso é que vai propiciar a conclusão sobre a evitabilidade ou não do acidente pelo condutor. Quando resolveu a Apelação 0043448-15.2010.8.26.0053, por exemplo, o TJSP reconheceu que o condutor trafegava “em trecho em que proibida a circulação de veículos - entre a faixa exclusiva de ônibus e a faixa de rolamento de veículos particulares”, e negou indenização.
            Antes de demandar é preciso verificar quem é responsável pela via (se ele é municipal, estadual ou federal). No caso de acidente em rodovia pedagiada, esse dever de conservação normalmente é assumido pela concessionária. No julgamento da Apelação 0002610-04.2013.8.26.0157, foi reconhecida a “relação de consumo” e a culpa da concessionária por “acúmulo de óleo em uma curva”.
            Se o condutor não produz elementos de convicção de que foi lesado, o seu pedido será improcedente (Apelação 3000304-70.2013.8.26.0590). É recomendável fotografar as irregularidades que deram causa ao evento lesivo e as consequências dele. Não bastam fotografias de buracos, de amassados ou de pneus rasgados. As imagens devem retratar os posicionamentos dos buracos na via, as condições de luminosidade e de tráfego; bem como devem identificar o veículo danificado e, com detalhes, todos os danos produzidos. A existência de buracos nem sempre autoriza a imposição de indenização porque pode ser que se conclua que, por serem poucos e/ou superficiais, não foram determinantes para o acidente (Apelação 0014174-77.2010.8.26.0482). Certa vez afastei indenização porque o condutor conhecia bem a via que percorria diariamente e utilizava motocicleta com suspensão propícia para pavimento com pequenas imperfeições.
            Dentro do possível aquele que se diz prejudicado deve arrolar testemunhas.
            Todo esse raciocínio normalmente também favorece a solução de reclamação por queda de pedestre em passeio público não fiscalizado pelo poder público (Apelação 0039605-50.2010.8.26.0309).
            É importante destacar que “a prescrição contra a Fazenda Pública, mesmo em ações indenizatórias, rege-se pelo Decreto 20.910/1932, que disciplina que o direito à reparação econômica, prescreve em cinco anos da data da lesão ao patrimônio material ou imaterial’” (Apelação 0167096-22.2009.8.26.0100). A Primeira Seção do STJ, sob o rito do art. 543-C do CPC, no julgamento do Recurso Especial 1.251.993/PR, assentou que os prazos prescricionais do Código Civil não são aplicados às demandas movidas contra a Fazenda Pública, prevalecendo o prazo quinquenal.
            A análise da responsabilidade, evidentemente, é feita caso a caso, à luz das provas produzidas.
Adriano Rodrigo Ponce de Oliveira
Juiz de Direito / Professor no Unisalesiano
Facebook Adriano Ponce Jurídico

(publicado no Diário de Penápolis de 3/9/2015 e no Correio de Lins de 8/9/2015; abordado em entrevista concedida à Rádio Regional Esperança aos 31/8/2015)