Quem sou eu

Juiz de Direito desde 2007. Titular do Juizado Especial Cível de Lins(SP). Ex-Professor do Curso de Direito do Unisalesiano em Lins(SP). Ex-delegado de polícia. Motociclista, tatuado e corintiano do "bando de loucos".

26 de jun. de 2016

Aplicativos do mal

Um dos primeiros textos que publiquei, em 1999, quando era delegado de polícia, tratou da minha indignação com uma atitude de certa forma corriqueira, mas incompreensível, de pessoas que se intitulavam “de bem”. Ele foi nominado “Sinal de Inteligência”.
Discorri sobre os “sinais de luz” de que motoristas se serviam, nas estradas, para alertarem os demais sobre a presença da polícia...
Expliquei que sinalizar a iminência de uma fiscalização para pessoas desconhecidas poderia facilitar, por exemplo, que um ladrão de carros conseguisse se evadir.
Ilustrei o texto com uma situação fictícia, mas perfeitamente possível de acontecer: João, depois de passar por uma blitze; começou a sinalizar a presença da polícia na rodovia; alertou o condutor de um VW/Gol de cor vermelha; possibilitou que o “beneficiado” alterasse a sua rota e ingressasse em uma estrada vicinal; e, ao chegar à sua casa, o “bondoso” motorista descobriu que o automóvel tinha sido furtado da própria esposa...
Lamentei que alguns motoristas relutavam em se conscientizarem da importância das fiscalizações para redução de acidentes de trânsito; apreensão de drogas e armas; recolhimento de veículos em mau estado de conservação; repressão ao furto e roubo de autos, de cargas e de animais; e detenção de condutores alcoolizados ou imprudentes por qualquer outra razão.
Ressaltei a necessidade de eliminação do hábito de aplicar o “sinal de luz”, pois a prática potencialmente beneficiava criminosos.
Recomendei ao leitor que, ao contrário, em “sinal de inteligência”, de cidadania, de aversão à impunidade e à injustiça, auxiliasse a polícia.
Muitos anos se passaram e, infelizmente, algumas pessoas continuam dedicando o seu tempo para enfraquecerem a já difícil repressão ao crime.
Naquela época poucos tinham acesso aos telefones celulares. Atualmente, ao contrário, muita gente alimenta aplicativos para “smartphones” criados especificamente para indicarem blitzes policiais, o que pode até gerar risco de morte para os servidores. Revoltante! Injustificável!
Impressiona o fato de essas mesmas pessoas, que utilizam aplicativos e também redes sociais para alertarem bandidos, criticarem com veemência instituições que se desdobram para tentarem garantir a sua segurança. Essas mesmas pessoas normalmente denotam absoluta falta de disposição de cooperação com as polícias e, consequentemente, com a comunidade, já que poderiam dedicar o seu tempo para denúncias úteis às ações policiais.
Alguns somente despertam para a necessidade de auxiliarem as autoridades depois que eles mesmos ou pessoas próximas acabam sendo vítimas de ações violentas. Somente depois disso é que “vestem a camisa” com o rosto da vítima, fundam associações etc. Às vezes, inclusive, fica evidente a intenção de usar a “desgraça” para autopromoção...
É preciso que as pessoas se conscientizem de que, ainda que não sejam suficientemente corajosas para delatarem malfeitores, pelo menos devem evitar atitudes que possam favorecê-los.
É inacreditável que esse tema tenha de ser destacado, pois era de se esperar que maioria das pessoas tivesse espírito de equipe, bom senso e se preocupasse com o próximo.
De qualquer forma, continuo esperançoso de que vale a pena fazer o alerta, tanto que decidi reavivar o assunto, cada vez mais atual, assim que deparei com a seguinte reportagem televisiva: policiais estão tendo de divulgar, falsamente, operações em certos locais, para, em seguida, se posicionarem noutros, na tentativa de conseguirem atingir minimamente os seus intentos, tudo isso por conta do crescente uso dos “aplicativos do mal” a que me referi. Muito triste, mas é a realidade...
Adriano Rodrigo Ponce de Oliveira
Juiz de Direito
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(publicado na edição de 26/5/2016 do Diário de Penápolis e na edição de junho/2016 da Revista Comunica)