Quem sou eu

Juiz de Direito desde 2007. Titular do Juizado Especial Cível de Lins(SP). Ex-Professor do Curso de Direito do Unisalesiano em Lins(SP). Ex-delegado de polícia. Motociclista, tatuado e corintiano do "bando de loucos".

26 de jun. de 2016

Ofensas recíprocas e indenização

As redes sociais, se bem utilizadas, constituem importantes instrumentos para interações, aprendizado e fortalecimento da cidadania. Todavia, não há dúvida de que o Facebook é um terreno fértil para confusões.
As discussões judiciais sobre postagens reputadas ofensivas são comuns.
Às vezes, a pessoa que se diz ofendida se contém, reproduz "telas", arrecada informações necessárias e propõe ação indenizatória sem revidar. A procedência da sua pretensão, é claro, dependerá da análise do que foi publicado, pois nem todo tipo de comentário sustenta indenização por danos morais. Será preciso considerar, inclusive, se a parte não apresenta sensibilidade excessiva, se não é intolerante. De qualquer forma, a solução mais sensata é transferir a tarefa de solucionar o caso ao Poder Judiciário. A ausência de vingança será bem vista pelo julgador.
Acontece que nem sempre quem se diz ofendido tem suficiente autocontrole para deixar de responder. É relativamente comum a "cegueira" tomar conta dos envolvidos e as trocas de ofensas serem fomentadas por terceiros inconsequentes. O surgimento de um espetáculo deplorável de insultos pode inviabilizar a aplicação da lei em favor daquele que primeiramente foi atingido.
Quem é ofendido, mas também acaba ofendendo, comumente se arrepende. Afinal, a autotutela (defesa pelos próprios meios, sem intervenção dos poderes públicos) normalmente serve para estimular novas ofensas, divertir expectadores e desperdiçar tempo e energia que poderiam ser mais bem investidos. Os envolvidos, invariavelmente, depois de serenados os ânimos, percebem que há maneiras mais sensatas e menos arriscadas para divergir e/ou para corrigir lesões.
Já deparei com um caso em que a parte quis "apagar" o que publicou, não conseguiu e teve de requerer intervenção judicial para conseguir eliminar a postagem. Até por isso é preciso refletir bastante antes de comentar ou responder. Alguns escritos acabam se eternizando na rede.
Às vezes o indivíduo precisa enfrentar diversos contratempos para aprender a se comportar diante da opinião divergente alheia ou daquilo que supõe que traduza ofensa. Alguns não aprendem nunca...
O mais impressionante é que alguns optam por debater, extravasar a indignação, também ofendem quando respondem, e, ao mesmo tempo, acionam o Judiciário para a reparação de danos. A leitura de alguns processos do gênero chega a provocar nojo. Nas audiências, mágoas são revolvidas. Mas essa "medição de forças" muitas vezes não gera procedência de pretensão indenizatória alguma.
Os tribunais normalmente não impõem indenizações quando as ofensas são recíprocas e proporcionais. Nesse sentido, já decidiu o Superior Tribunal de Justiça: “Inexiste dever de indenizar, quando constatada a ocorrência de ofensas recíprocas dos litigantes, violando norma basilar de convivência social, que é o respeito mútuo, corolário do princípio da solidariedade” (AREsp 236.284-DF, Rel. Min. Maria Isabel Gallotti, j. 22/10/13). O Tribunal de Justiça de São Paulo já arrematou: “tendo as duas partes agido igualmente sem urbanidade, a ninguém é devida qualquer indenização por abalo moral” (Apelação 0002572-83.2014.8.26.0180). Já houve negativa de indenização também porque não foi possível identificar quem originou o conflito.
É evidente que detalhes de cada embate nortearão a decisão judicial. Entretanto, ainda que seja impecavelmente técnica, ela nem sempre terá o condão de reparar o “estrago" já provocado.
É relevante salientar que, no âmbito penal, o Código estabelece, quando trata de ofensa à dignidade ou ao decoro, que o juiz pode deixar de aplicar a pena “quando o ofendido, de forma reprovável, provocou diretamente a injúria” (artigo 140). A retorsão imediata também pode afastar aplicação de pena.
Em resumo: nem sempre é fácil se segurar diante daquilo que a gente classifica como ofensa, mas quando há interesse em demandar por indenização e/ou responsabilizar criminalmente o ofensor, a pessoa deve se calar e peticionar. Somente dessa forma é que o Judiciário poderá equilibrar a situação. Quando a pessoa também ofende, ela se equipara ao ofensor e enfraquece a possibilidade de conseguir tutela estatal. O Judiciário não terá como intervir em seu favor, sob pena de provocar desequilíbrio, um verdadeiro favorecimento, se vier amparar quem escolhe se envolver em ofensas recíprocas. Se houver excesso no revide, as consequências legais dele poderão ser até mais graves...
Adriano Rodrigo Ponce de Oliveira
Juiz de Direito
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(publicado na edição de 28/4/2016 do Diário de Penápolis e na edição de maio de 2016 da Revista Comunica)