Quem sou eu

Juiz de Direito desde 2007. Titular do Juizado Especial Cível de Lins(SP). Ex-Professor do Curso de Direito do Unisalesiano em Lins(SP). Ex-delegado de polícia. Motociclista, tatuado e corintiano do "bando de loucos".

18 de mar. de 2014

Se meu filho fosse advogado...




            Com base na experiência profissional como juiz (que ainda não atua em foro digital) e atento à necessidade de preservação do ambiente, de economia de recursos públicos e de celeridade processual, caso meu filho fosse advogado ou estivesse na iminência de sê-lo, eu recomendaria a ele:

            1. Redija peças objetivas em páginas suficientes para que a situação seja compreendida. O que impressiona e dá resultado é a qualidade técnica e não a espessura da petição ou o papel vergê;

            2. De preferência, use números ou letras para individualizar parágrafos (como estou fazendo), o que favorecerá que você possa se reportar, no curso do processo, às afirmações já feitas;

            3. Em vez de mencionar “requerente”, “requerido 1” e “requerido 2” para narrar fatos, use os primeiros nomes das pessoas, o que evitará confusões. Ex. João vendeu o veículo para Marcos, que por sua vez o revendeu a Pedro;

            4. Não transcreva acórdãos ou artigos de lei, especialmente quando tratar de temas a respeito dos quais já não exista tanta polêmica jurídica, pois a reprodução é desnecessária (prefira apenas citar julgados pelos números);

            5. Não encarte impressões de julgados (não desperdice papel e tinta da sua impressora) e nem cópia integral de outro processo (selecione o que for útil à nova demanda);

            6. Prefira imprimir nos versos das folhas para reduzir o consumo de papel, favorecer o manuseio e baratear o futuro arquivamento dos autos (o Tribunal gasta proporcionalmente ao espaço utilizado);

            7. Numere as páginas das petições para evitar inversões de folhas que possam prejudicar a compreensão;

            8. Logo após a petição inicial, posicione a procuração e os recolhimentos, e só em seguida encarte outros anexos, o que favorecerá a conferência pelo cartório;

            9. Se a procuração contemplar nomes de vários advogados, procure grifar o seu nome para deixar claro que tem poderes;

            10. Organize documentos em ordem cronológica e, se forem vários, faça um índice e informe o que pretende com a juntada de cada um deles (não encarte uma “folha de apresentação” para cada documento para não duplicar a espessura dos autos);

            11. Não junte documentos repetidos e lembre-se de que junto com a inicial somente devem vir os documentos indispensáveis à propositura da ação e que os demais poderão ser apresentados depois (art. 283 do Código de Processo Civil);

            12. Não use folhas de suporte para documentos que, mesmo menores do que o formato A4, poderão ser perfurados e normalmente juntados sem que o seu conteúdo seja comprometido. Fixe guias de recolhimento nos versos das próprias petições de juntadas delas;

            13. Não dobre documentos se isso não for imprescindível, pois os serventuários e o juiz perderão tempo ao consultá-los;

            14. Utilize sempre um “check list” antes de distribuir a ação, evitando, dessa forma, que tenha de complementar documentos e recolhimentos, o que desperdiçará tempo do Judiciário e protelará a análise do seu pedido urgente;

            15. Utilize uma ou no máximo duas fontes de boa visibilidade, num tamanho razoável (de 11 a 13), e adote um só tipo de destaque (negrito, itálico ou sublinhado);

            16. Adote tabulação e pequeno espaço entre parágrafos, já que dessa forma será mais fácil distinguir onde cada um se inicia e termina;

            17. Utilize vocabulário simples para permitir que leigos compreendam a lide (nem sempre o uso de redação mais rebuscada é sinônimo de bom conhecimento jurídico);

            18. Seja técnico ao escrever, ou seja, não narre fatos ou formule pedidos de forma “apaixonada”, desesperada, ofensiva, como se o seu problema fosse o mais grave e mais urgente de todos; ou seu adversário fosse o pior dos seres humanos, já que na ânsia de tentar convencer o juiz você poderá, em verdade, despertar desconfiança;

            19. Atente-se sempre aos requisitos mínimos da petição inicial previstos no art. 282 do Código de Processo Civil: I - o juiz ou tribunal, a que é dirigida; II - os nomes, prenomes, estado civil, profissão, domicílio e residência do autor e do réu (normalmente a omissão da profissão interfere na apreciação de pedidos como o de gratuidade processual e de fixação de alimentos provisórios); III - o fato e os fundamentos jurídicos do pedido; IV - o pedido, com as suas especificações; V - o valor da causa; VI - as provas com que o autor pretende demonstrar a verdade dos fatos alegados; VII - o requerimento para a citação do réu;

            20. Livre-se de modelos arcaicos e questione-se sobre o grau de atualização dos modelos que utiliza;

            21. Não tente ludibriar o Juízo, informando valor da causa que não espelhe os reflexos econômicos da demanda e/ou não esteja condizente com a orientação jurisprudencial, somente para reduzir o recolhimento inicial ou tentar buscar sucumbência maior;

            22. Não requeira ao Juízo, comodamente, a tomada de providências que incumbiriam à própria parte, como a requisição de documentos, a não ser que já tenha havido tentativa frustrada e/ou que as informações sejam sigilosas e a intervenção judicial, em qualquer dos casos, seja imprescindível;

            23. Pergunte-se sempre: há alguma maneira de solucionar o problema sem recorrer ao Judiciário? Se a resposta for positiva, via de regra, não estará presente o interesse de agir e o processo poderá ser extinto;

            24. Estude constantemente as condições da ação e os pressupostos processuais, pois quem domina tais temas evita decisões inesperadas e entraves contrários às pretensões do seu cliente.

            Por fim, eu arremataria: assim agindo, meu filho, além de sensato, certamente será um profissional benquisto, colaborativo e que inspirará confiabilidade, o que, tenho certeza, refletirá positivamente na sua vida profissional.

Adriano Rodrigo Ponce de Oliveira

Juiz de Direito Diretor do Fórum de Penápolis(SP)

Professor no Unisalesiano/Lins