Quem sou eu

Juiz de Direito desde 2007. Titular do Juizado Especial Cível de Lins(SP). Ex-Professor do Curso de Direito do Unisalesiano em Lins(SP). Ex-delegado de polícia. Motociclista, tatuado e corintiano do "bando de loucos".

16 de set. de 2012

Expressões diferentes em demandas judiciais

Expressões diferentes em demandas judiciais
         No exercício da Magistratura eu tenho colecionado expressões redigidas com termos e formatos pouco usuais, algumas, pitorescas.
         Já houve que sustentasse “atempramento da recorrência” apenas para dizer que o recurso não foi manejado no prazo.
         Os Códigos recebem variados nomes, inclusive “pergaminho de ritos”.
         A decisão liminar já foi referenciada como aquela prolatada “longe dos holofotes do contraditório”. Mais do que a “fumaça do bom direito” (requisito jurídico), já se sustentou o “incêndio do bom direito” para enfatizar a urgência.
         Já se abusou da língua estrangeira (cujo uso é vedado pela legislação), ao se afirmar: “Pretende o autor que se lhe sejam fixados, como num “coup de magique”, danos morais...” (golpe de mágica).
         A natureza sempre é fonte inspiradora. O sol é o campeão de menções: “causa estranheza nesse subscritor o nobre autor, mesmo claro como a luz solar, diante da escritura...”. Já se falou do mar: “os fatos [...] comprovam oceanicamente que a negligência e a desídia para com a autora...”. A terra não tão firme foi citada: “esta ação sedimentada na malícia está fundada em areia movediça”. Certa vez se ponderou que “o que não está escrito o vento leva” para se rebater tese de que teria havido contrato verbal num certo sentido. E também que “a ré não juntou nenhum documento que comprovasse as suas alegações, portanto não passam as mesmas de meras conclusões ‘catadas ao vento’”.
         O mundo animal não ficou de fora: “Como a autora colocou o carro na frente dos bois, fato que deve ser repudiado por Vossa Excelência...”; “falar até papagaio fala! O duro é provar o que se alega a respeito de outrem”.
         Um Advogado alegou “desintencional cochilo da sua parte” para justificar uma falha.
         Uma petição foi ofertada por parte que se dirigiu à “dilúcida presença de Vossa Excelência para...” (dilúcido = lúcido, claro).
         Em vez de “licitação”, já se fez referência a “conclave”; em vez de “síntese”, já se falou em “epítome”.
         Termos técnicos às vezes não são pesquisados: “A durabilidade de tempo de vida dos espermas do autor é pequena” (esperma é o líquido que contém os espermatozóides).
         Há expressões que de tão rebuscadas se tornaram engraçadas: “Os plúmbeos argumentos trazidos pela autora não refletem a real luz da exatidão”; “feita essa preleção introdutória do espanque, ponto-a-ponto, formula-se o açoite” (ou seja, passa-se à defesa).
         Em ações penais muitas vezes surgem argumentos nada técnicos que não contribuem para os desfechos, mas retratam apenas desabafos: “não será a condenação desses dois pobres coitados que farão cessar toda sorte de irregularidades que ocorrem por todos os Detrans do Brasil” (sic). Houve quem tentasse sensibilizar o Magistrado, reclamando de estar “recolhido a um dos cubículos da cadeia pública desta cidade”.
         Por falar em crime, já li que “o embargante atira para todos os lados, como se fosse uma metralhadora descontrolada”.
         Referindo-se ao fato de o Ministério Público ter ajuizado ação de improbidade, a defesa fez questão de asseverar: “ninguém provocou oficialmente o Promotor Público [...] de modo que a provocação certamente foi como se costuma dizer na gíria ‘de orelhada’”.
         Equipamentos já foram criados pela imaginação de bacharéis: “Na verdade o cálculo – fls. 19 – demonstra isto sim que para se chegar aos 297 Kwh foi utilizado o chamado, no popular, “computador tupiniquins” ou “chutômetro”.
         A versão de uma ré já foi classificada pelo acusador como “papainolesca”...
         E como a criatividade do ser humano é inesgotável, brevemente haverá mais a relatar...
Adriano Rodrigo Ponce de Oliveira
Juiz de Direito da 2ª Vara de Penápolis(SP)
twitter.com/adrianoponce10